Saiba reconhecer os principais achados ultrassonográficos da atresia duodenal. Continue a leitura e fique por dentro de tudo dessa patologia.
A atresia duodenal é uma condição rara, mas grave, que afeta o sistema gastrointestinal, demandando rápida detecção e intervenção.
Assim, este artigo visa fornecer informações detalhadas sobre as atresias gastrointestinais, com foco especial na atresia duodenal, explorando suas causas, sintomas, fatores de risco e destacando a importância do ultrassom no diagnóstico.
Atresias gastrointestinais
De forma geral, a atresia é definida como um defeito congênito de uma víscera oca que resulta na obstrução completa do lúmen ou na ausência dele. Ela é uma das causas mais comuns de obstrução gastrointestinal no neonato e pode ocorrer em qualquer lugar do trato digestivo, sendo porém, a esofágica e a duodenal as mais comuns.
Em alguns casos, é possível que o neonato já apresente no útero manifestações clínicas. Com isso, é possível que seja realizado o diagnóstico dessas atresias no pré-natal.
Entretanto, nem sempre é fácil fazer esse diagnóstico já que vai depender do local de obstrução e do momento da idade gestacional no momento da realização do ultrassom.
Atresia duodenal
Como já foi falado, a atresia duodenal é uma patologia congênita, sendo uma das principais causas de obstrução intestinal fetal.
Nas fases iniciais da gestação, especificamente entre a sexta e a sétima semana, partes do trato intestinal tornam-se obstruídas devido à proliferação do epitélio endodérmico. A abertura dessas obstruções é restaurada à medida que o processo de recanalização ocorre entre a oitava e décima semana de gestação.
Entretanto, no caso de quem apresenta atresia, vai ocorrer um erro de recanalização do cordão sólido epitelial ou à proliferação endodérmica excessiva.
A obstrução é completa e, geralmente, ocorre abaixo da ampola de Vater, na segunda porção do duodeno.
Epidemiologia
Segundo dados de estudo, esta é uma patologia rara. A média é de 1 a 1,3 a cada 5000 a 10.000 nascidos vivos.
A presença da atresia duodenal está frequentemente associada a outras anomalias, dentre elas principalmente a Síndrome de Down (Trissomia do 21). Existe um estudo em que mostra que aproximadamente 30 a 40% das crianças possuíam a associação de ambas as anomalias.
Apesar disso, é possível encontrar outras anomalias associadas como:
- Cardiopatia congênita (20% dos casos);
- Anomalias renais;
- Pâncreas anular;
- Ânus imperfeito.
Além disso, é comum que esses recém-nascidos tenham ainda outras atresias intestinais associadas, como a jejunoileal e retal, além da atresia biliar.
Manifestação clínica da atresia duodenal
A atresia duodenal pode se manifestar desde a gestação, sendo possível a sua identificação na ultrassonografia no pré-natal. Está bastante associada à polidrâmnio intrauterino e a quadros de prematuridade. Entretanto, nem sempre é possível de se fazer.
Assim, as manifestações clínicas que o recém-nascido apresenta são vômitos após a primeira alimentação oral (24 a 38h). Esses vômitos aumentam progressivamente e podem ou não serem biliosos, dependendo do local de obstrução.
Se a atresia for abaixo da ampola hepatopancreática, o vômito será bilioso e, geralmente, é observado distensão abdominal.
Além disso, esse bebê ainda pode não conseguir eliminar o mecônio.
Classificação
A atresia duodenal é classificada com base em características específicas da obstrução e da anatomia do duodeno. A classificação mais comum divide em três tipos:
- I: diafragma (membrana) mucoso. A camada muscular está intacta nestes casos. A porção do duodeno proximal à atresia está dilatada e a porção distal está estreitada;
- II: há um cordão fibroso interposto às extremidades do duodeno atrésico;
- III: há completa separação das extremidades do duodeno atrésico. Comumente associada a anomalias ductais biliares incomuns.
Diagnóstico da atresia duodenal no pré-natal
O diagnóstico intrauterino se dá através do pré-natal, no momento do exame de ultrassom, geralmente no meio ou final do segundo trimestre. Conseguir identificar nessa é de grande importância para o prognóstico do recém-nascido, uma vez que reduz os riscos de complicações de má alimentação e vômito, como a depleção de volume, desequilíbrio eletrolítico e até mesmo pneumonia por aspiração.
Aqui iremos apresentar os principais achados na ultrassonografia e em outros exames de imagem na atresia duodenal. Mas antes, vamos apresentar os achados normais.
Achados ultrassonográficos normais do intestino
Antes de tudo, é importante lembrar que a interpretação desses achados pode variar dependendo da idade gestacional do feto.
O intestino começa a crescer e se formar durante a quarta ou quinta semana do desenvolvimento embrionário. Na 8ª semana, ocorre a formação de uma hérnia fisiológica do intestino médio que vai desaparecer depois da 12ª semana.
O lúmen intestinal ainda está colapsado no primeiro trimestre. Só começa a receber líquido a partir da 13ª semana e isso só aparece na imagem após as 20ª semana de gestação.
Em relação às alças intestinais, elas medem em torno de 7mm de diâmetro ou 15mm de comprimento ao longo do segundo e terceiro trimestre. Alças separadas do intestino delgado são distinguíveis após 28 semanas de gestação.
Ainda, é possível observar o peristaltismo na 18ª semana de gestação.
Além disso, o diâmetro do cólon aumenta com o avanço da gestação, atingindo diâmetros de até 23 mm preenchidos com mecônio a termo. A porção colônica do intestino é melhor visualizada após 24 semanas de gestação como regiões hipoecóicas ao longo da periferia do abdome.
O intestino é variavelmente ecogênico, às vezes semelhante em ecogenicidade ao fígado, baço e rins adjacentes.
Atresia duodenal através do ultrassom
Os achados da atresia duodenal através do ultrassom são referentes à sinais de obstrução intestinal. Geralmente o mesmo vai aparecer com a característica que chamamos de “Bolha dupla” como na imagem abaixo.

Imagem 1: Imagem ultrassonográfica pré-natal de atresia duodenal. Feto com 22 semanas de gestação. (A) A ultrassonografia axial do abdômen fetal mostra um estômago dilatado próximo a um duodeno dilatado. ( B) A imagem de ressonância magnética coronal T2w confirma a presença de uma “bolha dupla” com líquido de alto sinal no estômago e duodeno dilatado. A amniocentese revelou trissomia 21. Fonte: KING, 2023.
A diferenciação entre atresia duodenal e cisto de colédoco por ultrassonografia pré-natal pode ser desafiadora, mas a ressonância magnética fetal pode proporcionar uma visão mais clara.
Na atresia intestinal associada à gastrosquise, a ultrassonografia pré-natal revela dilatação intestinal (>10 mm), indicando maior risco de parto prematuro e maior taxa de mortalidade. Essa dilatação ocorre no estômago, na primeira parte e, frequentemente, na segunda parte do duodeno.
Por sua vez, o desenvolvimento de polidrâmnio, presente em mais de 50% dos casos, é atribuído à obstrução intestinal que interfere na absorção do líquido amniótico pelo feto.
Além disso, podemos ainda observar:
- Peristaltismo aumentado, o que chamamos de peristaltismo de luta;
- Alças dilatadas para além do normal;
- Intestino excessivamente ecogênico (indicativo de alguma anormalidade, como o trissomia do 21).
Achados na radiografia
O mesmo sinal de “Dupla bolha” (ou bolha dupla) do exame de ultrassom pode também ser observado na radiografia, como pode ser observado na imagem abaixo.
Fonte: Figueiredo et al, 2005.
Importante observar que a bolha do lado esquerdo, que é o estômago, é maior do que a do direito, onde está o duodeno proximal. Entretanto, apesar disso, não se pode garantir que seja atresia, pois a obstrução pode ter outra causa.
Diagnóstico da atresia duodenal no pós-natal
Quando o paciente apresentar as manifestações clínicas já citadas acima, logo após a primeira refeição oral, deve-se suspeitar de atresia intestinal em recém-nascido.
Assim, neste momento é importante começar a investigação desse bebê.
Anamnese
O primeiro passo é obter o histórico do pré-natal, incluindo algumas informações como:
- Idade gestacional;
- Histórico familiar, principalmente de fibrose cística, anomalias congênitas, etc;
- Uso de medicamentos;
- Complicações na gravidez.
Além disso, é muito importante ter acesso aos exames ultrassonográficos do pré-natal para se observar alguma alteração.
Exame físico
É fundamental realizar um exame físico completo ao diagnosticar atresia intestinal em recém-nascidos. Alguns aspectos importantes a serem considerados incluem:
- Comprometimento Respiratório;
- Sinais de depleção de volume;
- Presença ou não de icterícia;
- Anomalias congênitas;
- Examinar a localização e permeabilidade do ânus.
É ainda fundamental avaliar a aparência do abdômen, pois pode sugerir a localização da atresia. Obstruções distais geralmente causam distensão abdominal acentuada, enquanto obstruções proximais podem resultar em pouca distensão.
Além disso, é preciso palpar o abdômen para detectar massas e verificar a presença de sensibilidade abdominal, o que pode indicar peritonite. Em soma, deve-se observar a presença ou ausência de ruídos hidroaéreos e examinar a área inguinal em busca de hérnias.
Exames complementares
É indicado a radiografia, com ou sem contraste, a todos os recém-nascidos com sinais de obstrução intestinal. Normalmente se inicia com o RX simples e, tendo achados, segue com o uso de contraste uma vez que o mesmo ajuda na localização da obstrução.
Em relação aos exames laboratoriais, estes são indicados para avaliar a condição clínica da criança. Geralmente é solicitado:
- Hemograma completo
- Bilirrubinas
- Eletrólitos
- Ureia e creatinina
- Hemocultura
Entretanto, quando há suspeitas outras anomalias, alguns outros exames podem ser solicitados para ajudar no diagnóstico, como é o caso do ecocardiograma em suspeitas de malformações cardíacas.
Diagnósticos diferenciais das atresias do duodeno
Neonatos com sinais e sintomas obstrutivos, deve-se pensar em:
- Má rotação com vólvulo
- Doença de Hirschsprung
- Íleo meconial
- Pâncreas anular
- Cisto de colédoco
- Incisura angular proeminente causando bidissecção do estômago.
Tratamento
O tratamento da atresia duodenal geralmente envolve uma abordagem cirúrgica imediata. A correção cirúrgica visa aliviar a obstrução e restaurar a continuidade do trato gastrointestinal. Entretanto, em alguns casos, pode ser necessário realizar uma anastomose duodeno-duodenal ou duodeno-jejunal para reestabelecer o fluxo normal.
Apesar disso, o prognóstico após o tratamento cirúrgico é excelente e a taxa de mortalidade é muito baixa.
Complicações
Existem algumas complicações cirúrgicas que são possíveis de acontecer. As principais são:
- Megaduodeno
- Síndrome do laço cego
- Colecistite
- Esofagite
- Úlcera péptica
- DRGE
- Pancreatite
- Vazamento anastomótico
Ultrassonografia obstétrica morfológica
Não só a atresia de duodeno, mas tantas outras doenças podem ser detectadas pela ultrassonografia durante o pré-natal. Por isso, é de grande importância que tenhamos profissionais capacitados para realizar esses exames.
Assim, para aprimorar o conhecimento e as habilidades na realização e interpretação desses exames, o CETRUS oferece cursos especializados em morfológico de primeiro e segundo trimestre.
Dessa forma, esses cursos são desenhados para médicos que buscam aprofundar sua expertise na realização e análise desses exames, garantindo uma abordagem abrangente e precisa na avaliação do desenvolvimento fetal. Conheça mais sobre os cursos abaixo:
Referências
- BULAS, D. I. Prenatal diagnosis of esophageal, gastrointestinal, and anorectal atresia. UpToDate, 2023.
- FIGUEIREDO, S.S. et al. Atresia do trato gastrintestinal: avaliação por métodos de imagem. Artigos • Radiol Bras 38 (2), Abr 2005, https://doi.org/10.1590/S0100-39842005000200011
- KING, A. Intestinal atresia. UpToDate, 2023
- Sigmon DF, Eovaldi BJ, Cohen HL. Atresia e Estenose Duodenal. [Atualizado em 26 de junho de 2023]. In: StatPearls [Internet]. Ilha do Tesouro (FL): Publicação StatPearls; 2023 janeiro-. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK470548/







