Gestrinona em implantes subcutâneos: aplicações no tratamento de endometriose e miomas uterinos
Os implantes hormonais têm ganhado espaço como uma estratégia eficaz e segura no manejo clínico da endometriose e da adenomiose, especialmente em pacientes que apresentam sintomas persistentes ou que não respondem adequadamente aos tratamentos tradicionais. Dentre os fármacos utilizados, a gestrinona vem sendo estudada devido à sua ação antiproliferativa sobre o tecido endometrial ectópico. Essa característica a torna particularmente útil na redução de lesões, na melhora da dor pélvica crônica e na melhora da qualidade de vida das pacientes.
A administração por meio de implantes subcutâneos permite liberação contínua e prolongada do hormônio, proporcionando estabilidade dos níveis séricos e minimizando os efeitos adversos relacionados às flutuações hormonais. Além disso, essa via oferece maior comodidade e adesão ao tratamento, uma vez que elimina a necessidade de uso diário ou frequente de medicações orais.
Farmacologia da gestrinona
A gestrinona é um esteroide sintético derivado da 19-nortestosterona, com propriedades antiprogestagênicas, androgênicas e antiestrogênicas. Originalmente desenvolvida como contraceptivo, foi posteriormente estudada em pacientes com endometriose devido à sua capacidade de inibir o crescimento do tecido endometrial ectópico.
Uma das principais vantagens farmacológicas da gestrinona é sua longa meia-vida quando utilizada por via subcutânea, o que permite liberação contínua do princípio ativo por várias semanas ou meses, dependendo da formulação. Essa característica farmacocinética favorece a adesão ao tratamento, além de reduzir os efeitos adversos sistêmicos relacionados à flutuação hormonal.
Mecanismo de ação hormonal
A gestrinona atua por múltiplos mecanismos hormonais. Em primeiro lugar, ela inibe a secreção de gonadotrofinas (LH e FSH) pela hipófise, levando a uma supressão ovariana parcial. Além disso, antagoniza os receptores de progesterona e estrogênio nos tecidos-alvo, especialmente no endométrio e no estroma endometrial ectópico. Isso resulta em atrofia endometrial, redução do fluxo menstrual e alívio da dor pélvica associada à endometriose e à adenomiose.
Adicionalmente, seus efeitos androgênicos moderados contribuem para uma menor proliferação endometrial, embora também possam causar efeitos colaterais, como acne ou hirsutismo leve em algumas pacientes. Ainda assim, esses efeitos são frequentemente bem tolerados, sobretudo quando comparados à intensidade da dor pélvica crônica e à perda de qualidade de vida das pacientes com endometriose avançada.
Indicações clínicas: endometriose e miomas
Os implantes de gestrinona têm sido amplamente estudados em duas principais condições ginecológicas: a endometriose e os miomas uterinos. Em ambas as situações, o objetivo é reduzir a atividade estrogênio-dependente que sustenta o crescimento dos tecidos anômalos.
Papel da gestrinona no manejo da endometriose
A gestrinona é particularmente eficaz na redução da dor pélvica crônica, da dispareunia e da dismenorreia em pacientes com endometriose. O uso do implante subcutâneo permite uma ação contínua e direta sobre os focos endometrióticos, favorecendo a regressão das lesões e o controle sintomático em médio e longo prazo.
Pacientes com endometriose profunda, frequentemente não responsivas a anti-inflamatórios ou contraceptivos orais, podem se beneficiar significativamente dos implantes de gestrinona. Estudos clínicos demonstram melhora clínica expressiva, com alívio sintomático sustentado e menor necessidade de intervenção cirúrgica.
Utilização em pacientes com miomas uterinos
Embora menos comum, a gestrinona também tem sido empregada em alguns casos de miomatose uterina, sobretudo em pacientes com sintomas como sangramento uterino anormal e dor pélvica crônica. Nesse contexto, seu efeito antiprogestagênico contribui para reduzir o volume dos miomas e melhorar o perfil sintomático.
Contudo, é importante destacar que a gestrinona não é considerada tratamento de primeira linha para miomas, sendo mais indicada para pacientes que não desejam ou não podem se submeter a procedimentos invasivos e que apresentam contraindicação ou falha aos tratamentos hormonais convencionais.
Evidências científicas de eficácia
Diversas publicações científicas corroboram a eficácia dos implantes de gestrinona no manejo da endometriose. Estudos prospectivos e revisões sistemáticas apontam para melhora significativa da qualidade de vida das pacientes, redução da dor e regressão das lesões endometrióticas.
Além disso, comparações com outros agentes hormonais, como os análogos de GnRH, mostram que a gestrinona apresenta eficácia semelhante com menor incidência de efeitos colaterais relacionados à hipoestrogenemia severa. Ainda que a resposta clínica possa variar, a taxa de adesão ao tratamento é alta, sobretudo em regimes de liberação prolongada como os implantes.
Em relação à adenomiose, embora os dados ainda sejam limitados, alguns relatos de caso e séries clínicas indicam benefício sintomático, especialmente na redução da dismenorreia e do sangramento uterino anormal.
Riscos, efeitos adversos e contraindicações ao uso do Gestrinona
Como qualquer tratamento hormonal, os implantes de gestrinona não estão isentos de efeitos adversos. Por isso, a indicação deve ser criteriosa, considerando o perfil clínico e a expectativa da paciente.
Efeitos colaterais mais comuns
Durante o uso de implantes hormonais, alguns efeitos colaterais podem surgir, sendo geralmente leves, autolimitados e bem tolerados pela maioria das pacientes. Os mais frequentemente observados incluem:
- Acne de leve a moderada
- Aumento discreto de pelos (hirsutismo)
- Alterações no ciclo menstrual — como amenorreia (ausência de menstruação)
- Ou sangramentos de escape (spotting) —, ganho de peso e cefaleia.
Esses sintomas costumam aparecer nas primeiras semanas ou meses após a implantação e tendem a reduzir com o tempo, à medida que o organismo se adapta ao novo perfil hormonal. Ainda assim, é essencial que a paciente realize um acompanhamento clínico regular com o profissional responsável, especialmente nos primeiros meses de uso. Essa avaliação permite identificar possíveis reações adversas e, se necessário, ajustar a dose hormonal ou até substituir o tipo de implante utilizado, buscando maior conforto e adesão ao tratamento.
Embora esses efeitos sejam considerados comuns e, em geral, não representem risco à saúde, existem situações em que o uso de implantes está contraindicado. As contraindicações absolutas incluem: gravidez confirmada, período de lactação, presença de neoplasias hormônio-dependentes (como certos tipos de câncer de mama), trombofilias não controladas e doenças hepáticas graves.
Portanto, antes de iniciar o uso, é indispensável uma avaliação médica completa, com investigação de comorbidades e histórico familiar. A escolha do implante deve ser individualizada, respeitando as necessidades clínicas e expectativas da paciente, garantindo segurança, eficácia e conforto ao longo do tratamento.
Aspectos éticos e regulação
O uso de implantes hormonais exige não apenas conhecimento técnico, mas também atenção aos aspectos éticos e regulatórios, especialmente no contexto da gestrinona, cujo uso ainda gera debates no Brasil.
Situação regulatória da gestrinona no Brasil
Atualmente, a gestrinona não possui registro na Anvisa como medicamento ou implante aprovado. Isso significa que seu uso deve ser realizado com base em responsabilidade médica, mediante consentimento informado da paciente e formulação magistral em farmácias autorizadas.
A prescrição deve estar fundamentada em literatura científica e seguir os princípios da boa prática médica, respeitando a autonomia da paciente e os limites éticos da profissão. Nesse sentido, é essencial que o profissional esteja capacitado e atualizado quanto às diretrizes de uso e às implicações legais envolvidas.
Portanto, antes de prescrever implantes de gestrinona, o médico deve oferecer alternativas terapêuticas aprovadas e garantir que a paciente compreenda os riscos, os benefícios e o status regulatório do tratamento.
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Referências bibliográficas
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