O hálux valgo, também conhecido como joanete, é uma deformidade que afeta o hálux, causando o seu desvio lateral em relação ao primeiro metatarso. Essa condição afeta principalmente mulheres, sendo muito comum em faixas etárias mais avançadas. O desenvolvimento do hálux valgo envolve uma série de fatores biomecânicos, genéticos e ambientais, além de estar frequentemente associado ao uso de calçados inadequados.
Esta patologia não é apenas uma questão estética; a deformidade pode causar dor significativa, inflamação e limitação funcional, prejudicando a qualidade de vida dos pacientes.
Etiologia e patogênese
A etiologia do hálux valgo é multifatorial, envolvendo fatores hereditários e ambientais. A predisposição genética desempenha um papel importante no desenvolvimento da deformidade, sendo frequentemente observada em múltiplas gerações de uma mesma família, principalmente em mulheres. Estudos apontam que a herança familiar pode ser autossômica dominante com expressão variável, ou seja, algumas pessoas podem desenvolver a deformidade de maneira mais severa que outras, dependendo de fatores como a biomecânica do pé e a exposição a fatores de risco externos.
Além da predisposição genética, uma série de anormalidades estruturais pré-existentes podem favorecer o desenvolvimento do hálux valgo. Entre essas anormalidades, o pé plano (planovalgus) é um dos principais fatores que contribuem para o desalinhamento do primeiro metatarso. O pé plano altera a distribuição das forças durante a marcha, colocando maior pressão sobre o primeiro metatarso e, assim, facilitando o desvio lateral do hálux. Da mesma forma, pacientes com hipermobilidade ligamentar apresentam uma frouxidão nas articulações que também predispõe ao desalinhamento da articulação metatarsofalângica (MTF), principal articulação envolvida na deformidade.
O uso de calçados inadequados, como sapatos de bico fino e salto alto, é amplamente reconhecido como um dos principais fatores ambientais no desenvolvimento do hálux valgo. Esses calçados comprimem os dedos dos pés, forçando o hálux a desviar-se lateralmente e, ao mesmo tempo, exacerbam a sobrecarga na parte anterior do pé. Essa sobrecarga contínua pode agravar o desalinhamento articular, levando ao aparecimento de dor e inflamação nas estruturas periarticulares, especialmente na bursa, que está localizada sobre a proeminência óssea medial que surge como consequência do desvio do hálux. Assim, a combinação de predisposição genética e fatores ambientais desempenha um papel crucial no desenvolvimento e na progressão dessa condição.
Manifestações clínicas do hálux valgo
O quadro clínico do hálux valgo varia dependendo do grau de deformidade e da presença de complicações associadas. Nos estágios iniciais, muitos pacientes podem ser assintomáticos ou apresentar apenas uma leve alteração estética na posição do hálux. No entanto, com a progressão da deformidade, os sintomas pioram, dor e limitação funcional são as principais queixas.
Dor
A dor é o sintoma mais comum relatado por pacientes com hálux valgo, e geralmente está localizada na região medial do pé, onde a cabeça do primeiro metatarso se projeta para fora. Essa dor pode ser intermitente ou constante, e é exacerbada pelo uso de sapatos fechados ou apertados.
A dor decorre, em grande parte, da inflamação da bursa que cobre a proeminência óssea, uma condição conhecida como bursite. A bursite provoca edema, sensibilidade aumentada e, em casos mais severos, pode evoluir para uma infecção local, complicando ainda mais o quadro clínico.
Proeminência óssea na borda medial do pé no hálux valgo
Além da dor, a proeminência óssea na borda medial do pé é outra manifestação típica do hálux valgo. Com o tempo, essa proeminência torna-se mais evidente e pode desenvolver calosidades dolorosas devido ao atrito constante com os calçados.
Em casos avançados, essa saliência pode até mesmo ulcerar, causando desconforto severo e risco de infecções.
Limitação da amplitude
Outro aspecto importante a ser considerado é a limitação da amplitude de movimento da articulação MTF. À medida que a deformidade progride, ocorre uma subluxação dessa articulação, o que limita os movimentos de dorsiflexão e flexão plantar do hálux. Essa limitação afeta diretamente a função do pé durante a marcha, uma vez que o primeiro metatarso desempenha um papel crucial na fase de propulsão do ciclo de marcha.
Pacientes com hálux valgo frequentemente alteram sua forma de caminhar para compensar essa disfunção, o que pode resultar em sobrecarga dos demais metatarsos e, consequentemente, levar à metatarsalgia.
Desenvolvimento de deformidades nos outros dedos do pé
Outra complicação comum associada ao hálux valgo é o desenvolvimento de deformidades nos outros dedos do pé. A alteração biomecânica decorrente do desalinhamento do primeiro metatarso força os outros dedos a suportarem uma carga maior durante a marcha. Isso pode resultar em deformidades como dedos em martelo ou dedos em garra, que, por sua vez, agravam o quadro doloroso e dificultam ainda mais o uso de calçados. Além disso, essas deformidades secundárias também podem causar calosidades dolorosas na parte dorsal dos dedos ou na planta do pé, contribuindo para o desconforto geral do paciente.
Além disso, os sintomas não se restringem à região afetada, as alterações na marcha podem ter repercussões em outras articulações, como:
- Tornozelos
- Joelhos
- E até mesmo na coluna lombar.
A sobrecarga mecânica resultante do desalinhamento e da compensação postural pode levar ao desenvolvimento de dor nessas áreas, aumentando ainda mais o impacto funcional do hálux valgo.
Diagnóstico do hálux valgo
O diagnóstico do hálux valgo é essencialmente clínico, baseado na observação da deformidade e na história dos sintomas apresentados pelo paciente.
No entanto, a confirmação do diagnóstico e a avaliação da gravidade da deformidade dependem de exames de imagem, principalmente radiografias. A avaliação clínica deve ser minuciosa e incluir tanto a inspeção quanto a palpação da articulação metatarsofalângica, além de uma análise funcional do pé durante a marcha.
Exame físico
Durante a inspeção, o médico pode observar o desvio lateral do hálux e a presença de uma proeminência óssea na borda medial do pé, características clássicas do hálux valgo. Deve-se também verificar a presença de calosidades, ulcerações ou sinais de inflamação local, como edema e eritema. A palpação da articulação metatarsofalângica permite avaliar a sensibilidade local e a presença de bursite. A avaliação da amplitude de movimento da articulação MTF é fundamental, uma vez que a limitação desses movimentos é um indicativo da gravidade da deformidade.
A análise da marcha é outro aspecto importante no exame clínico. Pacientes com hálux valgo tendem a desenvolver padrões de marcha compensatórios para evitar a dor e a limitação funcional do primeiro metatarso. Isso pode resultar em uma marcha antálgica, com transferência de peso para os outros metatarsos ou para o lado lateral do pé. A identificação precoce dessas alterações é crucial, pois pode indicar a necessidade de intervenções mais agressivas, como o uso de órteses ou até mesmo cirurgia.
Radiografia simples
As radiografias simples em carga são o exame de imagem mais utilizado para confirmar o diagnóstico de hálux valgo e avaliar a sua gravidade. As radiografias devem ser realizadas com o paciente de pé, para que a distribuição das forças sobre o pé possa ser adequadamente avaliada. Os principais parâmetros medidos nas radiografias são o ângulo metatarsofalângico e o ângulo intermetatarsal. O ângulo metatarsofalângico é formado pela linha longitudinal do primeiro metatarso e a linha longitudinal da falange proximal do hálux. Valores normais desse ângulo variam entre 8 e 15 graus, sendo que valores acima de 15 graus indicam a presença de hálux valgo. Já o ângulo intermetatarsal é formado pela linha longitudinal do primeiro e do segundo metatarso, e valores normais estão abaixo de 9 graus.
Um aumento desse ângulo indica uma instabilidade no primeiro metatarso, o que agrava a deformidade.
Além dos ângulos, a radiografia pode revelar outras alterações, como a presença de artrose na articulação metatarsofalângica, evidenciada pelo estreitamento do espaço articular e pela formação de osteófitos. Em casos avançados, a artrose pode contribuir significativamente para a dor e a limitação funcional, sendo um fator importante na escolha do tratamento, que pode variar de medidas conservadoras, como o uso de órteses e fisioterapia, até a necessidade de intervenção cirúrgica.
Tratamento do hálux valgo
O tratamento do hálux valgo pode variar dependendo da gravidade da deformidade e dos sintomas do paciente.
Casos leves
Em casos leves, as abordagens conservadoras são frequentemente indicadas, incluindo:
- Mudanças no tipo de calçado
- Uso de órteses
- Exercícios para fortalecimento
- Alongamento dos músculos e ligamentos do pé
- Além de anti-inflamatórios para controle da dor e inflamação.
Essas medidas têm como objetivo aliviar os sintomas e prevenir a progressão da deformidade, mas não corrigem o desalinhamento ósseo.
Cirurgia percutânea: quando indicar?
No entanto, quando a dor se torna incapacitante, quando há falha nas abordagens conservadoras ou a deformidade progride de forma significativa, a intervenção cirúrgica pode ser necessária. A cirurgia percutânea é uma opção indicada para casos moderados a graves de hálux valgo, especialmente quando há necessidade de correção óssea significativa com menor agressividade cirúrgica. Ela envolve pequenas incisões e o uso de instrumentos especiais para realinhar os ossos, corrigir o desvio do hálux e remover as proeminências ósseas.
A principal vantagem da cirurgia percutânea é o tempo de recuperação mais rápido e menor dano aos tecidos moles em comparação com as técnicas abertas tradicionais.
Esse tipo de cirurgia é indicado principalmente para pacientes com:
- Deformidades moderadas
- Boa qualidade óssea
- E que desejam um tempo de reabilitação reduzido.
Contudo, a decisão de indicar a cirurgia percutânea deve ser individualizada, considerando o grau de deformidade, a idade do paciente, a qualidade óssea e as expectativas em relação à função e estética do pé pós-operatório.
Cirurgia percutânea de pé com treinamento em cadáver fresh Frozen
As técnicas minimamente invasivas na correção de deformidades no pé estão revolucionando a medicina! Agora você tem a oportunidade de dominar essas técnicas com o curso exclusivo de Cirurgia Percutânea de Pé no Cetrus.
Com treinamento prático em peças anatômicas fresh frozen, este curso vai te capacitar a realizar procedimentos avançados para correção de patologias como hálux valgo e outras deformidades dos pés.
Referências bibliográficas
- KOZONOE, Débora Yuriko; MACHADO, Gladston Oliveira; ANDRADE, Antonio Marcos de; NOVO, Neil Ferreira. Hálux valgo: os parâmetros radiológicos de pacientes portadores da deformidade. Hallux Valgus: Radiological Parameters of Patients.
- NERY, Caio; BALLERINI, Flávio José; KOBATA, Silvia Iovine. Hálux valgo em homens: demografia, etiologia e radiologia comparativas. Disponível em: <link aqui>. Acesso em: 05 de Outubro em 2024.







