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Classificação de tumores retais: o que diz a Sociedade de Radiologia Abdominal?

Entenda a classificação de tumores retais conforme a Sociedade de Radiologia Abdominal e como realizar esse estadiamento é importante para a abordagem do seu paciente. Boa leitura! 

Os tumores retais, que incluem cânceres do reto e do canal anal, representam uma parcela significativa dos cânceres colorretais em todo o mundo. Considerando o aumento crescente da expectativa de vida, a prevalência desses tumores é ainda mais preocupante. 

O “Consensus Statement from the Society of Abdominal Radiology Rectal & Anal Cancer Disease-Focused Panel” foi desenvolvido por um grupo de especialistas em radiologia abdominal que se concentra no câncer retal e anal. 

O documento visa promover uma abordagem padronizada e consistente na avaliação de pacientes com esses tipos de câncer, para garantir diagnósticos precisos e ajudar na tomada de decisões de tratamento.

Importância da classificação precisa de tumores retais

A classificação precisa de tumores retais é de suma importância por várias razões fundamentais na prática médica e no tratamento do câncer colorretal.

Através dela é possível determinar o estágio da doença, que é crucial para prever o prognóstico do paciente. Saber se o câncer está em estágio inicial ou avançado afeta as opções de tratamento e as taxas de sobrevivência. 

Ainda, com base na classificação do tumor retal, os médicos podem tomar decisões informadas sobre a abordagem de tratamento mais adequada. Isso inclui a escolha entre cirurgia, radioterapia, quimioterapia, imunoterapia ou uma combinação dessas modalidades terapêuticas.

Outro ponto importante é que uma classificação padronizada os tumores retais permite uma comunicação clara e consistente entre médicos de diferentes especialidades, como cirurgiões, oncologistas e radiologistas. 

Quanto ao paciente, informá-los sobre o estágio e a classificação da doença permite que eles entendam melhor sua condição e participem ativamente nas decisões sobre o tratamento. 

Descrição de anatomia do reto e região perirretal 

Canal anal

O canal anal, com um comprimento de 2,5 a 4,0 cm, começa na porção superior onde a ampola retal se estreita devido à formação do anel anorretal, uma estrutura muscular palpável. Esse anel é resultado da fusão do músculo puborretal, que faz parte do complexo muscular levantador do ânus, com os esfíncteres interno e externo do canal anal na parte inferior.

Esfíncter externo e interno do canal anal e o sulco interesfincteriano

O esfíncter externo do canal anal termina distalmente ao esfíncter interno do canal anal, e o sulco interesfincteriano é o plano palpável que pode ser percebido entre as extremidades desses dois esfíncteres. 

O sulco interesfincteriano coincide aproximadamente com a margem anal, que marca a porção final do canal anal.

Periano

Além disso, o periano, ou margem anal, se estende lateralmente por 5 cm a partir da margem anal e é caracterizado pela presença de folículos pilosos e glândulas.

Divisões do canal anal

Internamente, o canal anal pode ser dividido em porções proximal e distal por uma linha irregular chamada de linha dentada ou pectinada, que é representada em roxo no diagrama. As porções proximal e distal da linha dentada têm características distintas em termos de irrigação arterial, inervação nervosa e drenagem linfática venosa. 

A junção escamo-colunar (JEC) está localizada na porção proximal do canal anal e marca a transição entre o epitélio colunar retal e o epitélio escamoso anal. É importante observar que a posição exata da JEC pode variar ao longo do tempo devido à substituição do epitélio colunar pelo epitélio escamoso em um processo chamado de metaplasia escamosa. 

A zona de transformação anal (ATZ) é a área onde todos os aspectos da metaplasia escamosa estão presentes ou ocorreram recentemente.

Anatomia do reto. Fonte: Bleday et al, 2023.

Estadiamento do câncer retal e perirretal por Ressonância Magnética conforme a Sociedade de Radiologia Abdominal (SAR)

Segundo o consenso da Sociedade de Radiologia Abdominal, a ressonância magnética é a modalidade de imagem preferida para o estadiamento do câncer retal, principalmente devido à sua capacidade de delinear a extensão do tumor primário.

Nesse caso, o seu estadiamento é realizado da seguinte maneira (A ressonância magnética frequentemente não consegue distinguir entre tumores T1 e T2):

  • Tx – o tumor primário não pode ser avaliado; 
  • T0 – nenhum tumor primário visível; 
  • T1 – o tumor se estende para envolver a submucosa; 
  • T2 – o tumor se estende para envolver a muscularis propria; 
  • T3 – o tumor se estende além da muscularis propria para envolver a gordura mesorretal. Os tumores T3 são subdivididos da seguinte forma:
    • T3a < 1 mm; 
    • T3b: 1-5 mm; 
    • T3c: 5-15 mm; 
    • T4d > 15 mm; 
  • T4 – o tumor infiltra/invade a reflexão peritoneal (T4a) ou outros órgãos e estruturas pélvicas (T4b).
Camadas do cólon e reto com estágios T associados. Fonte: Matalon SA, Mamon HJ, Fuchs CS, et al. Câncer anorretal: distinções anatômicas e de estadiamento críticas que afetam o uso da radioterapia. Radiográficas 2015; 35:2090 e Manual de estadiamento do câncer do American Joint Committee on Cancer (AJCC), 8ª edição, Amin MB (Ed), Chicago: Springer Science+Business Media, LLC, 2017.

O câncer retal inicial é definido como um tumor primário que ainda está confinado pela musuclaris propria e sem evidência de linfonodos locorregionais (N0) ou doença metastática (M0). Por isso, podem ser tratados cirurgicamente sem quimiorradioterapia neoadjuvante.

Linfonodos e as suas categorias

Ainda, o estadiamento dos linfonodos é uma das partes mais importantes do estadiamento do câncer retal. Sendo assim, os linfonodos: 

  • Locorregionais: mesorretais, mesentéricos inferiores e retais superiores, linfonodos ilíacos internos e obturatórios são considerados linfonodos locorregionais no câncer retal;
  • Não locorregionais/distantes: todos os outros linfonodos, incluindo inguinais, ilíacos externos, ilíacos comuns e paraaórticos, são considerados linfonodos não locorregionais/distantes no câncer retal.

Pensando nos linfonodos que envolvem categorias N (envolvimento dos linfonodos regionais pelo câncer), temos que: 

  • N0: nenhum linfonodo locorregional anormal;
  • N1: entre 1-3 linfonodos locorregionais anormais (N1a – 1 linfonodo, N1b – 2-3 linfonodos);
  • N2: mais de 3 linfonodos locorregionais anormais (N2a – 4-6 linfonodos, N2b – 7 ou mais lifonodos). 

O estadiamento não se restringe apenas a quantidade de linfonodos, mas também existem critérios morfológicos e de tamanho, a fim de definir linfonodos suspeitos! Sendo assim, ainda conforme a SAR, temos linfonodos locorregionais: 

  • Com diâmetro inferior a 5 mm são considerados suspeitos se apresentarem os três critérios morfológicos malignos: (a) bordas irregulares, (b) intensidade de sinal heterogênea e (c) forma redonda;
  • Entre 5-9 mm precisam de dois critérios morfológicos para serem suspeitos;
  • Com mais de 9 mm são suspeitos independentemente dos critérios morfológicos.

Estadiamento por Tomografia computadorizada por Colonografia (CTC)

Essa é uma técnica de imagem bem menos comum que a ressonância magnética na prática clínica. Apesar disso, a CTC pode oferecer informações valiosas sobre o estágio do câncer retal. 

A CTC pode detectar o tumor primário no reto e avaliar sua localização, tamanho e extensão na parede do reto. Ela pode ajudar a determinar se o tumor se estendeu além da camada muscular da parede retal.

Ela ainda pode identificar linfonodos aumentados na região pélvica, o que pode ser indicativo de envolvimento dos linfonodos por células cancerosas. A presença de linfonodos aumentados é um importante fator de estadiamento.

O tumor primário (T) é avaliado conforme seu tamanho, diâmetro e comprimentos. A invasão da parede retal é observada para determinar se o tumor se estende além da camada muscular (T3) ou invade estruturas adjacentes (T4). 

A CTC pode ajudar a identificar se o câncer se infiltrou em vasos sanguíneos ou linfáticos (invasão vascular) e/ou se está envolvendo estruturas perineurais. Essa é uma informação valiosa, já que a invasão vascular é uma característica importante que pode indicar um estágio mais avançado da doença. 

O que torna a ressonância magnética superior à CTC?

A ressonância magnética é conhecida por oferecer uma resolução de tecidos moles superior à CTC. 

Assim, a MRI é capaz de fornecer imagens mais detalhadas das estruturas anatômicas e patológicas. Isso é particularmente importante na avaliação do câncer colorretal, onde a identificação precisa da extensão do tumor, o envolvimento dos linfonodos e a invasão de órgãos vizinhos são fundamentais.

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Estadiamento do câncer retal por TC Pélvica: vantagens e desvantagens

As vantagens da TC em relação à RM para identificar os tumores retais são: 

  • Amplamente disponível e geralmente é mais acessível em termos de custo em comparação com a RM;
  • Rápida e fornece imagens em alta resolução, o que pode ser útil na detecção de metástases hepáticas;
  • Eficaz na avaliação de estruturas ósseas, como o sacro, que podem ser relevantes em casos avançados de câncer colorretal.

Por outro lado, O RM é um exame menos acessível e disponível, mais demorado e mais limitado quanto às contraindicações dos pacientes, como dispositivos médicos implantados e claustrofobia.

Quanto às limitações da TC, temos que: 

  • Utiliza radiação ionizante, o que pode ser uma preocupação em termos de exposição à radiação, especialmente em pacientes jovens ou que requerem repetidas avaliações;
  • Resolução de tecidos moles da TC é inferior à da RM, tornando-a menos sensível para identificar pequenas metástases locais e linfonodos afetados;
  • Não é a melhor escolha para avaliar a invasão perineural, que é um fator de estadiamento importante em alguns casos de câncer colorretal.

Papel da Ultrassonografia endorretal no estadiamento do câncer de reto e perirretal

Combinar a ultrassonografia endorretal com outras modalidades de imagem desempenha um papel importante no estadiamento do câncer colorretal e perirretal. 

A ultrassonografia endorretal é eficaz na avaliação do tumor primário (T) no reto e no canal anal. Ela pode fornecer informações detalhadas sobre o tamanho do tumor, sua extensão na parede do reto e sua relação com estruturas circundantes.

Além de avaliar o tumor primário, a ultrassonografia endorretal é útil para detectar metástases em tecidos perirretais, como invasão na gordura perirretal ou em estruturas perirretais, incluindo os músculos elevadores do ânus.

Ela ainda pode ser usada para orientar biópsias direcionadas do tumor primário e de linfonodos suspeitos. Ela também é usada em procedimentos minimamente invasivos, como a ressecção endoscópica do tumor.

Indicação para fazer USG endorretal

No entanto, a USG endorretal nem sempre é necessária, embora seja útil. A escolha de usá-la pode ser indicada em situações como: 

  • Quando há suspeita de envolvimento da parede retal, mas a extensão exata ainda não foi determinada;
  • Se a cirurgia for a principal opção terapêutica, já que essa avaliação precisa citada acima é crucial, tornando a USG endorretal valiosa;
  • Em casos mais complexos, nos quais a ressonância magnética (RM) ou a tomografia computadorizada (TC) não fornecem informações claras o suficiente;
  • Monitorar a resposta do tumor ao tratamento após terapias neoadjuvantes (pré-cirúrgicas) ou outras modalidades terapêuticas. 

Leia também: Por que fazer uma especialização médica com o Cetrus?

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Referências 

  1. Pretreatment local staging evaluation for rectal câncer. Ronald Bleday, MD. UpToDate
  2. Rectal Cancer Lexicon: Consensus Statement from the Society of Abdominal Radiology Rectal & Anal Cancer Disease-Focused Panel. Thomas A. Hope.