Ultrassonografia na Anestesiologia: como a técnica revoluciona a prática clínica

Anestesiologista vestido com avental cirúrgico, máscara e touca observa atentamente um monitor multiparamétrico ao lado de um paciente intubado em uma mesa cirúrgica.

Índice

A ultrassonografia tem se consolidado como uma ferramenta indispensável na Anestesiologia moderna, transformando a prática clínica ao oferecer maior precisão, rapidez e segurança nos procedimentos.

Seu uso permite desde a visualização detalhada de estruturas anatômicas para realização de bloqueios periféricos até o monitoramento hemodinâmico e avaliação pulmonar à beira-leito, ampliando a capacidade diagnóstica e intervencionista do anestesiologista. Assim, a técnica não apenas otimiza a tomada de decisão, mas também reduz complicações, eleva a efetividade das intervenções e redefine o padrão de cuidado no perioperatório.

O que é ultrassonografia aplicada à anestesiologia?

A ultrassonografia aplicada à anestesiologia consiste no uso de ondas sonoras para gerar imagens em tempo real das estruturas anatômicas, permitindo ao anestesiologista visualizar tecidos, nervos, vasos e órgãos antes e durante os procedimentos.

Essa tecnologia torna a prática mais precisa, segura e personalizada, uma vez que possibilita avaliar a anatomia do paciente, identificar variantes e guiar intervenções de forma direta, reduzindo a dependência exclusiva de marcos anatômicos superficiais.

Evolução da ultrassonografia no cuidado perioperatório

Ao longo das últimas décadas, o ultrassom evoluiu de um equipamento restrito a poucos usos, como punção venosa e alguns bloqueios, para um recurso versátil, amplamente empregado na rotina perioperatória.

Avanços como maior resolução, aparelhos portáteis e sondas específicas, por exemplo, transformaram a técnica em uma ferramenta indispensável para avaliação rápida, monitorização hemodinâmica e planejamento de procedimentos invasivos, consolidando seu papel no atendimento de pacientes em condições críticas.

Por que a ultrassonografia se tornou essencial na prática anestésica?

Contribuição para decisões clínicas rápidas e assertivas

A capacidade de gerar imagens imediatas e de fácil interpretação permite ao anestesiologista tomar decisões mais ágeis e fundamentadas. Assim, em situações como dificuldade de acesso vascular, avaliação de via aérea, suspeita de complicações cardiopulmonares ou necessidade de bloqueios regionais, o ultrassom oferece uma visão objetiva da anatomia, orientando o posicionamento de agulhas, cateteres e intervenções, além de ajudar a escolher a melhor estratégia anestésica para cada paciente.

Aumento da segurança dos procedimentos

O uso do ultrassom reduz a incerteza associada a técnicas guiadas apenas por marcos anatômicos, permitindo a identificação visual da trajetória da agulha, da dispersão do anestésico e das estruturas críticas. Dessa forma, diminui o risco de lesões inadvertidas, punções desnecessárias e complicações graves, especialmente em pacientes com anatomia alterada.

Redução de complicações e falhas técnicas

A visualização direta das estruturas torna os procedimentos mais previsíveis e eficientes, diminuindo erros e aumentando as taxas de sucesso. Além disso, a detecção precoce de posicionamentos inadequados e a possibilidade de correção imediata evitam repetidas tentativas, o que reduz dor, sangramento, falhas técnicas e eventos adversos.

Aplicações de alto impacto no perioperatório

A ultrassonografia ampliou significativamente o arsenal diagnóstico e terapêutico do anestesiologista. Assim, hoje, ela é fundamental no acesso vascular difícil, nos bloqueios nervosos periféricos, na anestesia regional, na avaliação do espaço epidural, na monitorização cardíaca por ecocardiograma, no manejo de complicações pulmonares e até na inserção de sondas e drenagens.

Principais aplicações da ultrassonografia para anestesiologistas

Anestesia regional

A anestesia regional enfrenta um desafio central: a dificuldade de confirmar com precisão a posição exata dos nervos utilizando métodos tradicionais. Como o sucesso do bloqueio depende da distribuição adequada do anestésico ao redor das estruturas nervosas, a introdução da ultrassonografia em tempo real trouxe uma mudança significativa na prática.

Com ela, o anestesiologista consegue identificar nervos periféricos, acompanhar a trajetória da agulha e observar a dispersão do anestésico. A aparência dos nervos no ultrassom muda conforme o plano de corte:

  • Em vista transversal, apresentam padrão em “favo de mel”;
  • Em vista longitudinal mostram feixes paralelos hipoecoicos.

A visualização contínua da ponta da agulha permite ajustar sua posição conforme a dispersão do anestésico, evitando contato com vasos e diminuindo complicações como pneumotórax, punção arterial ou lesão nervosa.

Estudos demonstram que os bloqueios realizados com ultrassom apresentam início de ação mais rápido, melhor qualidade anestésica, necessidade reduzida de anestésico local e menor incidência de eventos adversos. Além disso, regiões tradicionalmente difíceis de abordar, como o nervo ciático, tornam-se mais acessíveis quando podem ser visualizadas diretamente.

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Avaliação das vias aéreas com ultrassonografia

A ultrassonografia das vias aéreas tornou-se uma ferramenta complementar valiosa para o anestesiologista, permitindo analisar dimensões, identificar alterações estruturais e até visualizar elementos como epiglote e possíveis corpos estranhos, sem necessidade de sedação em pacientes cooperativos. Essa capacidade de mensuração objetiva é essencial para planejar procedimentos e monitorar respostas ao tratamento, especialmente em casos de vias aéreas potencialmente difíceis.

Por ser um método simples, seguro e não invasivo, o ultrassom oferece boa visualização de tecidos moles quando associado ao conhecimento anatômico adequado. Além disso, o ultrassom também apoia procedimentos como traqueostomias, ajudando a mapear vasos, tecidos e a linha média. Ademais, em cenários emergenciais, mostrou eficácia em confirmar o posicionamento do tubo endotraqueal.

POCUS em anestesia: hemodinâmica, pulmões e FAST

Na prática anestésica, o uso do ultrassom point-of-care (POCUS) tornou-se uma ferramenta indispensável para avaliação rápida de instabilidade hemodinâmica, alterações pulmonares agudas e presença de líquido livre em cavidades.

Diante da frequência com que o choque circulatório e complicações respiratórias surgem no perioperatório, o POCUS oferece ao anestesiologista uma forma imediata, dinâmica e não invasiva de identificar causas e direcionar intervenções.

No contexto hemodinâmico, o POCUS permite aplicar protocolos estruturados, como o RUSH, que organiza a investigação do choque em três componentes:

  • Bomba (coração);
  • Tanque (pulmões, grandes vasos e abdome);
  • Tubos (aorta e veias periféricas).

Com poucas janelas ecográficas, é possível reconhecer derrames pericárdicos, disfunção ventricular, hipovolemia, pneumotórax, sangramento intra-abdominal e até trombose venosa. Esse mapeamento imediato orienta decisões críticas, como reposição volêmica, suporte inotrópico, anticoagulação ou necessidade de intervenção cirúrgica.

Além disso, a ultrassonografia pulmonar é amplamente utilizada devido à sua alta sensibilidade para alterações agudas. A partir da análise de artefatos e padrões ultrassonográficos, identifica-se pneumotórax, consolidações, congestão pulmonar, atelectasias e derrames pleurais.

Por fim, o FAST (Focused Assessment with Sonography for Trauma), embora tradicionalmente associado ao trauma, tem utilidade no perioperatório e na recuperação anestésica, principalmente para investigar rapidamente líquido livre abdominal ou torácico. Além disso, em pacientes que desenvolvem hipotensão inexplicada após procedimentos, o FAST ajuda a detectar sangramentos ocultos ou complicações cirúrgicas precoces.

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Acesso venoso e arterial guiado por ultrassom

O uso da ultrassonografia para acesso vascular transformou a abordagem tradicional baseada apenas em marcos anatômicos superficiais. Ao permitir identificar com precisão a localização, profundidade, diâmetro, direção e permeabilidade de veias e artérias em diferentes regiões a técnica, reduz significativamente falhas e complicações.

A tecnologia pode orientar a punção de duas maneiras: por imagem bidimensional em tempo real ou pelo Doppler com sinal sonoro.

Na prática, vasos centrais e periféricos são facilmente identificados com aparelhos de alta resolução, sendo possível distinguir artérias, que são mais rígidas, pulsáteis e pouco compressíveis, de veias, que variam de calibre e colapsam com leve pressão. A inserção da agulha pode ser realizada após identificação prévia do vaso ou sob visualização direta durante todo o procedimento, otimizando a segurança.

Estudos, especialmente sobre cateterização venosa central, demonstram que a orientação ultrassonográfica diminui tentativas, reduz falhas e minimiza complicações em comparação com a técnica às cegas. Além disso, sua utilidade se estende a pacientes com hematomas, obesidade ou trombos, facilitando a escolha do ponto ideal de punção e ampliando a segurança do procedimento.

Desafios na incorporação do ultrassom na rotina anestésica

A adoção plena da ultrassonografia na anestesiologia ainda enfrenta obstáculos relevantes. Um dos principais desafios é a curva de aprendizado. Isso porque o domínio da ultrassonografia exige treinamento estruturado, com etapas teóricas e práticas que envolvem aquisição de imagens, interpretação e documentação adequada.

Além disso, o método apresenta limitações técnicas inerentes ao exame à beira do leito (POCUS). A avaliação costuma ser essencialmente qualitativa, menos completa e menos padronizada do que um ecocardiograma formal, que demanda profissionais altamente treinados e certificados. A qualidade das imagens pode ser comprometida por fatores do paciente ou do equipamento, e alguns achados não substituem exames cardiológicos detalhados. Assim, o ultrassom no perioperatório deve ser interpretado com cautela e não elimina a necessidade de avaliação especializada quando indicada.

Por fim, muitos serviços ainda enfrentam barreiras estruturais e organizacionais. A disponibilidade limitada de aparelhos, a falta de protocolos específicos e a escassez de estudos voltados para esse cenário dificultam sua implementação.

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Referências

  • Guimaraes MF et al. O auxílio da ultrassonografia em emergências anestésicas. Revista Médica de Minas Gerais. Disponível em: https://rmmg.org/artigo/detalhes/2205. Acesso em: 18 nov 2025.
  • Gupta PK, Gupta K, Dwivedi AN, Jain M. Potential role of ultrasound in anesthesia and intensive care. Anesth Essays Res. 2011 Jan-Jun;5(1):11-9. doi: 10.4103/0259-1162.84172. PMID: 25885294; PMCID: PMC4173359.
  • Papa FV. Ultrassom cardíaco focado na prática anestésica: técnica e indicações [Focused cardiac ultrasound in anesthetic practice: technique and indications]. Braz J Anesthesiol. 2020 May-Jun;70(3):288-294. doi: 10.1016/j.bjan.2020.03.012. Epub 2020 Jun 18. PMID: 32653229; PMCID: PMC9373215.

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