Tudo que você precisa saber sobre a histeroscopia, menopausa e o uso deste exame de imagem para diagnóstico e tratamento de patologia em mulheres.
A histeroscopia é um procedimento diagnóstico e terapêutico amplamente utilizado na prática ginecológica. O objetivo deste texto é discutir, com base em evidências científicas, o papel da histeroscopia nesse contexto, destacando indicações, limitações e benefícios para a saúde da mulher na pós-menopausa.
Menopausa: o que é e quais suas alterações fisiológicas
A menopausa é definida como o período da vida da mulher caracterizado pela cessação permanente da menstruação, resultante da perda da função folicular dos ovários. O diagnóstico é clínico e retrospectivo, sendo estabelecido após 12 meses consecutivos de amenorreia sem outra causa patológica, fisiológica ou iatrogênica que explique o quadro.
A idade média da menopausa ocorre por volta dos 50 anos, com uma faixa considerada normal entre 45 e 55 anos. Antes dos 40 anos, a cessação da função ovariana é considerada insuficiência ovariana primária (ou menopausa precoce), uma condição distinta.
Fases da transição menopausal
A menopausa não é um evento súbito, mas o ponto culminante de um processo gradual conhecido como transição menopausal ou climatério, que pode ser dividido em três fases:
- Perimenopausa (ou transição menopausal): Começa anos antes da menopausa, quando os ciclos menstruais tornam-se irregulares devido à queda progressiva dos níveis de estrogênio e progesterona. Sintomas incluem ondas de calor, irregularidade menstrual e alterações de humor.
- Menopausa: Marcada pela última menstruação espontânea da mulher. Confirmada retrospectivamente após 12 meses sem menstruação.
- Pós-menopausa: Inicia-se após a menopausa e representa o período restante da vida da mulher. É subdividida em:
- Pós-menopausa precoce: primeiros cinco anos após a menopausa.
- Pós-menopausa tardia: a partir do sexto ano.
Alterações hormonais
A menopausa é marcada por uma transição hormonal significativa, resultando do declínio progressivo da função ovariana. Esse processo envolve mudanças nos níveis de hormônios esteroides e gonadotróficos, que afetam diversos sistemas fisiológicos.
Assim, a menopausa está associada a uma redução significativa na produção de estradiol (principal estrogênio produzido pelos ovários) e progesterona, além do aumento dos níveis de hormônio folículo-estimulante (FSH) e hormônio luteinizante (LH) devido à ausência de feedback negativo ao eixo hipotalâmico-hipofisário.
Estradiol
O estradiol é o principal estrogênio produzido pelos ovários em mulheres em idade reprodutiva. Sua produção ocorre principalmente em folículos ovarianos, sob o estímulo do hormônio folículo-estimulante (FSH).
Na menopausa, a falência folicular leva a uma queda abrupta nos níveis de estradiol, com concentrações reduzidas para menos de 20 pg/mL (em comparação aos níveis de 50-400 pg/mL na fase reprodutiva). A redução do estradiol está associada a sintomas vasomotores (ondas de calor), alterações urogenitais (atrofia vaginal) e perda de densidade óssea, além de efeitos no metabolismo cardiovascular e cerebral.
Progesterona
A produção de progesterona é diretamente dependente da ovulação e da formação do corpo lúteo, que desaparece com o término do ciclo menstrual na menopausa.
A ausência de progesterona contribui para o desequilíbrio estrogênio-progesterona, aumentando o risco de hiperplasia endometrial em mulheres que ainda apresentam exposição residual ao estrogênio (ex.: por aromatização de andrógenos).
Hormônio Folículo-Estimulante (FSH)
Com a falência ovariana, há uma redução acentuada no feedback negativo mediado pelo estradiol e pela inibição sobre o eixo hipotalâmico-hipofisário. Isso resulta em um aumento sustentado dos níveis de FSH, frequentemente acima de 30 mUI/mL, valor utilizado como marcador laboratorial da menopausa.
Hormônio Luteinizante (LH)
O LH também se eleva na menopausa, embora em menor proporção que o FSH. Níveis aumentados de LH podem atingir valores de 15-50 mUI/mL. Esse desequilíbrio entre FSH e LH reflete a ausência de atividade folicular e a incapacidade do sistema reprodutivo de resposta a esses hormônios.
Sinais e sintomas
Os sintomas associados à menopausa variam em intensidade e podem impactar a qualidade de vida:
- Sintomas Vasomotores: Ondas de calor (fogachos) e sudorese noturna.
- Alterações Urogenitais: Atrofia vaginal (ressecamento, prurido, dor durante o ato sexual) e incontinência urinária.
- Sintomas Psicológicos: Alterações de humor, ansiedade, depressão, insônia e fadiga.
- Alterações Metabólicas e Osteomusculares: Perda de massa óssea (osteopenia e osteoporose). Aumento do risco cardiovascular (dislipidemia e resistência à insulina).
- Alterações Físicas: Redução da elasticidade da pele, ganho de peso ou redistribuição da gordura corporal.
Além disso, a redução do estradiol contribui para alterações no metabolismo lipídico, com aumento de LDL e triglicerídeos e redução de HDL, o que eleva o risco cardiovascular. O estradiol também tem efeitos vasodilatadores diretos e propriedades anti-inflamatórias, cuja perda pode favorecer a disfunção endotelial e a aterosclerose.
Alterações endometriais na pós-menopausa
A pós-menopausa é acompanhada por uma redução significativa na produção de estrogênio e progesterona, levando à atrofia endometrial. Essa mudança reduz o risco de hiperplasia endometrial, mas não elimina a possibilidade de desenvolvimento de patologias, como pólipos endometriais, hiperplasia ou carcinoma endometrial. Além disso, os fatores de risco, como obesidade, diabetes, terapia hormonal e histórico de câncer, influenciam diretamente a prevalência dessas condições.
Sinais de alerta
O sangramento uterino anormal (SUA) na pós-menopausa é o principal motivo de investigação diagnóstica. Embora possa ser atribuído a causas benignas, como atrofia endometrial ou pólipos, até 10% das mulheres com esse sintoma apresentam carcinoma endometrial. Assim, a avaliação precoce e adequada do endométrio é crucial para excluir malignidade.
Histeroscopia: o que é?
A histeroscopia é um procedimento médico utilizado para visualizar diretamente o interior da cavidade uterina e do canal cervical com auxílio de um dispositivo chamado histeroscópio. Este instrumento consiste em um tubo fino, equipado com uma câmera e uma fonte de luz, que é introduzido pelo canal vaginal e cervical até o útero, permitindo ao médico avaliar e, em alguns casos, tratar alterações intrauterinas.
Tipos de histeroscopia
A histeroscopia pode ser classificada em duas categorias principais, dependendo do objetivo do procedimento:
Histeroscopia diagnóstica
Realizada para investigar sintomas ou achados clínicos, como sangramento uterino anormal, infertilidade ou alterações detectadas em exames de imagem (ex.: ultrassonografia). Geralmente, é um procedimento ambulatorial, sem necessidade de anestesia ou com anestesia local.
Histeroscopia cirúrgica
Realizada para tratar condições intrauterinas, como pólipos, miomas submucosos, aderências (sinéquias) ou septos uterinos. Normalmente requer anestesia (local, regional ou geral) e pode demandar equipamentos adicionais, como instrumentos cirúrgicos que são introduzidos pelo canal do histeroscópio.
Vantagens da histeroscopia
A histeroscopia permite a visualização direta da cavidade uterina e do canal cervical, utilizando uma câmera acoplada a um histeroscópio. Pode-se realizar este exame em consultório ou sob anestesia, dependendo da indicação e do estado clínico da paciente.
Alguns de seus benefícios são:
- Diagnóstico preciso: A histeroscopia oferece sensibilidade superior a 90% para detecção de lesões intrauterinas, como pólipos, miomas submucosos e carcinomas.
- Possibilidade de biópsia guiada: A visualização direta permite a coleta de amostras direcionadas de áreas suspeitas, aumentando a acurácia do diagnóstico.
- Opções terapêuticas: Em muitas situações, a histeroscopia possibilita a remoção de lesões benignas no mesmo procedimento, evitando intervenções adicionais.
Comparação com outros métodos
Utiliza-se a ultrassonografia transvaginal (USTV) como exame inicial para avaliação do endométrio, dada sua acessibilidade e custo. Contudo, sua acurácia depende de fatores como a espessura endometrial e a habilidade do operador. Quando a USTV identifica alterações suspeitas, como espessamento endometrial maior que 4-5 mm na pós-menopausa, a histeroscopia é indicada para uma avaliação detalhada.
Indicações de histeroscopia na pós-menopausa
As diretrizes internacionais e consensos clínicos sugerem a histeroscopia nos seguintes cenários:
Sangramento Uterino Anormal (SUA)
Na pós-menopausa, qualquer sangramento vaginal é considerado anormal e requer investigação imediata devido ao risco de estar associado a doenças graves, como câncer endometrial.
O SUA na pós-menopausa é a principal indicação para a histeroscopia. A presença de espessamento endometrial (>4-5 mm) em mulheres sintomáticas aumenta a suspeita de patologias, como pólipos, hiperplasia ou carcinoma.
Achados anormais na ultrassonografia transvaginal
A USTV é um exame inicial de triagem. Nos casos em que há espessamento endometrial ou presença de lesões focais, a histeroscopia é essencial para confirmação diagnóstica.
Rastreio de lesões pré-malignas ou malignas
Mulheres com fatores de risco para câncer endometrial, como síndrome de Lynch, terapia com tamoxifeno ou obesidade, podem se beneficiar de histeroscopia mesmo na ausência de sintomas.
Investigação de achados inconclusivos
Resultados inconclusivos de métodos de imagem ou biópsia endometrial ambulatorial indicam a necessidade de histeroscopia para elucidar o diagnóstico.
Papel terapêutico da histeroscopia
A histeroscopia não se restringe ao diagnóstico; também desempenha papel terapêutico importante, especialmente em casos de lesões benignas. Considera-se a polipectomia histeroscópica, por exemplo, padrão-ouro para remoção de pólipos endometriais. Miomas submucosos e aderências uterinas também podem ser tratados histeroscopicamente.
Risco de câncer endometrial: decisões baseadas em evidências
Estudos têm demonstrado que o risco de malignidade aumenta com a idade e outros fatores de risco, como obesidade e uso de tamoxifeno. A histeroscopia é particularmente útil em mulheres de alto risco, pois combina diagnóstico e biópsia direcionada. Em revisão sistemática, associou a histeroscopia a maior taxa de detecção de câncer endometrial em comparação com biópsia cega.
Contraindicações e limitações
Embora amplamente segura, a histeroscopia possui contraindicações, como:
- Infecção pélvica ativa;
- Perfuração uterina suspeita;
- Doenças graves descompensadas.
Além disso, a técnica tem limitações em lesões difusas, como hiperplasia generalizada, onde a biópsia por curetagem pode ser complementar.
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Referências
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- CASPER, R.F. Clinical manifestations and diagnosis of menopause. Uptodate, 2024.
- CARVALHO, C.M.; ROSAL, M.A. Eficácia da histeroscopia diagnóstica em mulheres na pós menopausa. Research, Society and Development, v. 11, n. 1, e54811125454, 2022.
- FELDMAND, S. Overview of the evaluation of the endometrium for malignant or premalignant disease. Uptotade, 2024.






