A ultrassonografia ocular, também denominada ecografia ocular, corresponde a um método de imagem indispensável para avaliação de infecções e inflamações oftalmológicas.
A inflamação ocular, independentemente de sua causa, está frequentemente associada à perda de transparência das estruturas oculares, como opacidades na córnea, na câmara anterior, no vítreo ou no cristalino, o que acaba dificultando a visualização do fundo do olho. Dessa forma, a ultrassonografia torna-se o exame de primeira escolha nesses casos.
Benefícios da ultrassonografia ocular
Entre os principais benefícios associados ao uso da ultrassonografia ocular estão:
- Método não invasivo.
- Fácil execução, tanto em adultos quanto em crianças.
- Não é necessária a realização de sedação ou anestesia geral.
- Não necessita de meios ópticos transparentes.
- É confiável, reprodutível e eficaz.
- Permite o estudo de diversas patologias, como tumores intraoculares, infecções e inflamações oftalmológicas, traumas oculares, hemorragia do vítreo, descolamento da retina e/ou da coroideia e doenças que afetam o nervo óptico (NO) e os músculos oculomotores (MOM).
Princípios básicos da ultrassonografia ocular
A ultrassonografia ocular é um exame de imagem estrutural que fornece informações sobre as propriedades mecânicas dos tecidos oculares, com base na interação do som com as interfaces encontradas durante sua propagação.
Baseia-se, portanto, no princípio da reflexão do som, utilizando ondas mecânicas de alta frequência (superior a 20 KHz), geradas por um transdutor que converte impulsos elétricos em vibrações mecânicas e vice-versa.
A propagação das ondas acústicas gera vibrações no meio por onde passam, resultando em deflexões longitudinais com áreas alternadas e periódicas de compressão e rarefação. As principais características dessas ondas físicas são:
- Comprimento de onda (λ).
- Frequência (f).
- Período (T).
- Amplitude (a).
A frequência influencia diretamente a capacidade da ecografia de diferenciar dois pontos próximos, conhecida como resolução espacial. Portanto, frequências mais altas apresentam maior resolução.
Como o olho é um órgão superficial, sondas de 10, 20, 35 ou 50 MHz são utilizadas, sendo as últimas especialmente adequadas para a ultrassonografia de alta resolução, utilizada para estudo do segmento anterior do olho.
Ademais, a impedância acústica (Z) representa a resistência de um meio à passagem do som, resultante do produto entre a velocidade do som e a densidade do meio. A velocidade do som (c), por sua vez, é constante para cada material e depende de suas propriedades elásticas e densidade.
Portanto, o ultrassom se propaga em diferentes velocidades nos meios oculares, sendo mais rápido em sólidos do que em líquidos.
Além disso, durante a interação com as estruturas intraoculares, sofre processos de absorção, transmissão e reflexão, sendo esse último convertido em impulso elétrico, amplificado e processado para gerar uma imagem bidimensional exibida em tempo real no monitor.
Características do ECO
As características do eco exibidas no monitor (apresentadas como pontos no modo B e deflexões da linha de base no modo A) são influenciadas por diversos fatores, tais como:
- Absorção e refração do ultrassom.
- Ângulo de incidência do ultrassom.
- Tamanho, formato e consistência da interface.
Absorção e refração do ultrassom
Quanto maior a densidade do meio, maior a absorção, o que reduz a transmissão para as estruturas posteriores, resultando em imagens menos brilhantes no modo B e com deflexões menores no modo A.
Por exemplo, um cristalino opacificado absorve significativamente o som, dificultando a obtenção de imagens de boa qualidade dos segmentos posteriores, exigindo o uso de ângulos de incidência que contornem o cristalino.
Ângulo de incidência do ultrassom
O ângulo de incidência do ultrassom é um fator determinante para o brilho (no modo B) e a amplitude (no modo A) do eco gerado.
Por isso, a sonda deve ser posicionada, sempre que possível, de forma perpendicular à superfície a ser examinada. Caso seja colocado em um ângulo oblíquo, parte das ondas sonoras será refletida sem retorno à sonda, resultando em uma deflexão de menor amplitude.
Tamanho, formato e consistência da interface
No que diz respeito ao terceiro ponto, quanto mais plana a superfície examinada, maior será o brilho (modo B) e a amplitude (modo A) do eco gerado.
Em contrapartida, uma interface curva, irregular ou esférica provoca maior dispersão das ondas sonoras, o que compromete a qualidade do sinal de retorno.
Embora a ecografia no modo B seja um exame bidimensional, é fundamental que o médico oftalmologista adote uma abordagem tridimensional para identificar e localizar alterações na ecoestrutura normal do globo ocular e da órbita. Para isso, é necessário possuir experiência e domínio das diferentes técnicas de posicionamento da sonda, permitindo a comparação e visualização das informações obtidas nos diversos quadrantes e meridianos.
Técnica da ultrassonografia ocular
A ultrassonografia de contato nos modos A e B, realizada sobre as páçébras (com aplicação de gel para melhorar a transmissão do som) ou sobre a córnea/conjuntiva (usando anestésico tópico), fornece informações úteis, desde que o exame seja realizado de forma metódica, com tempo adequado e considerando a história e observações clínicas do paciente.
Durante a realização do exame, deve-se seguir algumas orientações. Quanto à posição do paciente, o exame é mais confortável quando ele está deitado, com o médico à cabeceira e o ecógrafo ao seu lado (direito ou esquerdo, conforme a preferência).
Além disso, usando sondas de maior frequência, obtém-se a melhor resolução, essencial para estudar a parede ocular, o nervo óptico e os músculos oculomotores.
A variação do ganho (amplificação do sinal) ajuda a melhorar a visualização da área em estudo. Por exemplo, em casos de hemorragia vítrea, com o ganho elevado, é possível detectar até sangue de baixa densidade.
O ecograma deve registrar a incidência utilizada, bem como o quadrante ou meridiano examinado.
Aplicação da ultrassonografia ocular
A ultrassonografia ocular pode ser utilizada para o estudo de diversas patologias. Infecções e inflamações oftalmológicas, por exemplo, apresentam-se com hipotransparência dos meios.
Neste bloco, revisarmos as principais lesões inflamatórias e a aplicabilidade da ultrassonografia ocular no diagnóstico dessas lesões.
Panuveíte
A panuveíte caracteriza-se pelo envolvimento tanto do segmento anterior quanto do posterior do globo ocular, além da órbita anterior. As principais causas de panuveíte incluem sífilis, toxoplasmose, tuberculose, sarcoidose, doença de Behcet, síndrome de VKH e oftalmia simpática.
Na ultrassonografia ocular, observa-se diversas alterações, como:
- Opacificação do vítreo.
- Descolamento de retina exsudativo.
- Espessamento ou descolamento da coroideia.
- Edema do disco óptico.
- Esclerite posterior com aumento do espaço subtenoniano.
Endoftalmite
A endoftalmite infecciosa é uma causa potencial de cegueira, tornando fundamental o diagnóstico precoce e o tratamento adequado.
O exame de ultrassonografia ocular permite avaliar rapidamente a gravidade e a extensão da infecção, além de identificar alterações associadas, como:
- Opacidades de baixa refletividade, localizadas ou dispersas na cavidade vítrea, que são frequentemente observadas nestes casos.
- Quando há descolamento posterior do vítreo, a presença de opacidades no espaço sub-hialoideu indica atividade da infecção.
- O espessamento da área macular sugere edema macular.
Sem tratamento adequado, a infecção pode evoluir para formas específicas, como a formação de bandas ou membranas vítreas, tração vítreoretiniana e descolamento de retina ou coroideia.
Esclerite posterior
A esclerite posterior afeta o segmento posterior de maneira difusa ou nodular e, muitas vezes, sua causa não pode ser identificada.
Alguns casos estão associados a doenças sistêmicas, especialmente vasculites, enquanto outros podem estar relacionados a inflamações intraoculares (panuveíte) ou orbitárias (como celulite, tumor, pseudotumor ou oftalmopatia tiroideia).
Na fase inicial, a esclerite posterior provoca espessamento da esclera, acompanhada de dor, sinais inflamados e limitação da motilidade ocular. Embora nas formas anteriores o diagnóstico clínico seja frequentemente evidente, o exame ultrassonográfico é fundamental nas esclerites posteriores.
Na esclerite posterior difusa, o achado ultrassonográfico mais relevante é o espessamento difuso da parede ocular, com aumento do espaço subtenoniano (uma área que, normalmente, não é visível), formando uma linha espessa hiporrefletiva que separa a parede ocular da gordura orbitária. Quando envolve uma região peripapilar, gera uma imagem típica conhecida como sinal do T.
Além disso, também podem ser observados descolamento da coroideia e/ou retina.
Vitrite
A vitrite associada à uveíte posterior, seja de origem endógena ou exógena, apresenta características ultrassonográficas semelhantes às da endoftalmite:
- Opacidades vítreas de baixa refletividade, mas com menor formação de membranas.
- O edema macular, muitas vezes presente no processo inflamatório, pode persistir mesmo após a resolução da uveíte, devendo ser sempre avaliado em exames de acompanhamento.
Em algumas infecções, como a toxoplasmose, além da vitrite, ocorre uma retinocoroidite focal. Nesses casos, o espessamento da parede ocular pode ser identificado mais facilmente ao reduzir o ganho e eliminar a refletividade do vítreo.
Desafios e limitações da técnica
Alguns dos principais desafios e limitações associados à técnica de ultrassonografia ocular incluem:
- Qualidade da imagem: Depende de vários fatores, como a qualidade do equipamento, a frequência da sonda e a habilidade do operador. Além disso, estruturas próximas podem causar distorções nas imagens, dificultando a avaliação de áreas profundas do olho, como a retina e o nervo óptico.
- Dependência do operador: O exame de ultrassonografia ocular requer alto nível de habilidade e experiência do operador para posicionar corretamente a sonda, ajustar as configurações e interpretar as imagens. A falta de experiência pode levar a diagnósticos imprecisos.
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Referências
- PINTO, F. Atlas de Ecografia Oftálmica. 1ª ed. 2013.







