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Rastreamento de ventriculomegalia: como é feito e principais pontos de observação no exame

Aprenda a realizar o rastreamento de ventriculomegalia, como deve ser feito e os principais pontos a serem avaliados pelo médico no exame. Boa leitura! 

O rastreamento da ventriculomegalia é um procedimento fundamental na medicina fetal, pois pode indicar a presença de condições neurológicas ou outras anomalias congênitas. É essencial que o médico saiba conduzir adequadamente esse processo, interpretando os resultados com precisão e diferenciando a ventriculomegalia de outras condições.

O que é a ventriculomegalia?

O alargamento dos ventrículos cerebrais, habitualmente chamado de ventriculomegalia, é um marcador não especifico de alguma anormalidade, sinalizando assim a possibilidade de malformações no sistema nervoso central (SNC) ou em outros órgãos. Além disso, trata-se também, do diagnóstico mais comum de alteração cerebral fetal.

Ventriculomegalia e ventrículo normal.

A presença de ventrículos laterais normais ao exame obstétrico diminui de maneira acentuada o risco para anormalidades no SNC, enquanto o seu achado alterado leva a um aumento deste risco. Muitas estratégias já foram criadas com a intenção de avaliar os ventrículos e atualmente, utiliza-se a medida dos átrios ventriculares logo abaixo da fissura parieto-occipital. Em fetos normais o valor de referência para os ventrículos laterais deve ser de até 9,9 mm, entre 15-40 semanas de gestação.

Direção do fluxo de líquido cefalorraquidiano. Fonte: Norton, 2023.

Graus de ventriculomegalia 

Ventriculomegalia severa

Quando encontramos ventrículos com medidas superiores a 15 mm estamos diante de uma ventriculomegalia severa e isto está frequentemente associado com malformações intracranianas. O prognóstico é variável e depende muito mais da causa da ventriculomegalia do que da dilatação em si. Nos casos em que os fetos possuem alargamento ventricular mais significativo, os ventrículos costumam ser afetados de forma bilateral.

Ventriculomegalia leve

Um valor intermediário para a medida do ventrículo, entre 10-15 mm, é habitualmente chamado de ventriculomegalia leve e está menos associado a malformações significativas do SNC, entretanto ainda pode haver associação com defeitos de fechamento do tubo neural. 

Ventriculomegalia leve também está associado com anomalias cromossômicas e o risco de trissomia do 21 é 3,8 vezes maior quando este é um achado isolado. Quando a ventriculomegalia leve é isolada e não possui outras anomalias associadas, a maioria dos recém-nascidos são assintomáticos e o seu achado frequentemente é unilateral.

Quando ventriculomegalias leves são encontradas, é de extrema importância excluir outras anomalias. Uma avaliação ultrassonográfica fetal deve ser realizada com maior atenção para a avaliação do SNC. 

Testes de diagnóstico fetal para anomalias

Testes de diagnóstico fetal para anomalias cromossômicas devem ser oferecidos e testes cromossômicos podem ser considerados. A avaliação ultrassonográfica deve ser minuciosa com o estudo de toda a coluna, podendo ser complementada pela via transvaginal para que seja realizado um melhor estudo do SNC, principalmente se o feto estiver em apresentação cefálica.

A importância de se valorizar um feto com ventriculomegalia é indiscutível. Trata-se de um achado muito frequente e que sinaliza para o examinador a necessidade de uma avaliação da morfologia fetal ainda mais cuidadosa em busca de outras alterações.

As etiologias para esta condição são diversas e, sempre que for o desejo do casal, devem ser investigadas, o que permite melhor seguimento da gestação, condutas específicas e uma adequada avaliação de prognóstico.

Indicações de rastreamento de ventriculomegalia 

O rastreamento de ventriculomegalia é frequentemente realizado durante a gravidez para identificar a dilatação anormal dos ventrículos cerebrais do feto.

Algumas das indicações para as indicações de rastreamento da ventriculomegalia são: 

  1. Idade materna avançada:
  • Gestantes com idade avançada (35 anos ou mais) têm um risco ligeiramente aumentado de anomalias no desenvolvimento do feto, incluindo ventriculomegalia. Portanto, o rastreamento pode ser recomendado.
  1. Histórico familiar:
    • Caso a família da gestante tem um histórico de anomalias cerebrais congênitas ou genéticas, há um risco aumentado de ventriculomegalia. O rastreamento pode ser apropriado nessas situações.
  2. Anomalias prévias no ultrassom:
    • Caso um exame de ultrassom anterior durante a gravidez revelou qualquer anormalidade no sistema nervoso central do feto, como ventriculomegalia, é recomendável rastrear o desenvolvimento dos ventrículos cerebrais para avaliar a progressão ou a gravidade.
  3. Gestação de alto risco:
    • Algumas gestações são classificadas como de alto risco devido a fatores como diabetes gestacional, pressão alta, infecções, uso de medicamentos teratogênicos ou exposição a substâncias tóxicas. Nestes casos, o rastreamento de ventriculomegalia pode ser parte de uma avaliação mais abrangente.
  4. Infecções virais durante a gravidez:
    • Exemplos: citomegalovírus (CMV) e rubéola;
    • Gestantes que contraem essas infecções merecem ser rastreadas com cuidado. 
  5. Uso de medicações teratogênicas:
    • Exemplos: acido valproico e warfarina. 
  6. Ultrassonografias anômalas: 
    • Em caso de achados anormais, o acompanhamento subsequente com rastreamento mais específico é apropriado. 

Quando rastrear a ventriculomegalia?

A avaliação dos ventrículos é uma parte integrante dos exames de ultrassom fetal. A ventriculomegalia é tipicamente identificada pela primeira vez durante um exame anatômico fetal de rotina no segundo trimestre, geralmente entre a 18ª e a 20ª semana de gestação. 

No entanto, ela também pode ser detectada durante um ultrassom de rotina realizado por qualquer motivo no final do segundo trimestre ou durante o terceiro trimestre.

No final do primeiro trimestre ou início do segundo trimestre, o ultrassonografista pode ter uma suspeita subjetiva de ventriculomegalia, mas critérios objetivos para definir medidas normais e anormais dos ventrículos cerebrais ainda não estão disponíveis.

A ultrassonografia é a técnica de escolha para a avaliação de ventriculomegalia. O átrio do ventrículo lateral é a região onde se unem o corpo, o corno posterior (região occipital) e o corno inferior (região temporal). O diâmetro atrial permanece constante entre a 15ª e a 40ª semana de gravidez, com médias relatadas variando de 5,4 a 7,6 mm e com um limite superior normal inferior a 10 mm.

A medição do átrio do ventrículo lateral é realizada no plano transventricular (axial), ao nível dos cornos frontais e do cavum do septo pelúcido, com os hemisférios cerebrais apresentando simetria. 

Técnica do exame para avaliação de ventriculomegalia por USG 

O átrio do ventrículo lateral deve ser medido no plano transventricular (axial) ao nível dos cornos frontais e cavum do septo pelúcido, com os hemisférios cerebrais de aparência simétrica. 

Medição dos ventrículos laterais cerebrais fetais. Fonte: Cortesia de Mary Norton, MD.

Os paquímetros devem ser colocados na margem interna das paredes medial e lateral dos átrios, ao nível do sulco parieto-occipital, de forma perpendicular ao eixo longitudinal do ventrículo lateral. Posicionamentos incorretos incluem medições no ponto médio-médio, ponto externo-externo ou em um posicionamento muito posterior, na parte mais estreita do ventrículo, ou em um ângulo não perpendicular ao eixo ventricular. 

É importante observar que pode haver uma considerável variação na interpretação entre diferentes observadores, sendo mais comum em diâmetros ventriculares próximos a 10 mm e quando outras anomalias do sistema nervoso central são identificadas.

Adicionalmente, o cérebro fetal normal possui uma aparência semelhante ao líquido cefalorraquidiano (LCR), o que, por vezes, pode levar a um diagnóstico equivocado de ventriculomegalia. Portanto, uma avaliação minuciosa por parte de um ultrassonografista experiente é de suma importância.

Leia também: como fazer o diagnóstico de restrição de crescimento intrauterino?

Diagnóstico diferencial 

Lesões no sistema nervoso central que podem ser equivocadamente identificadas como ventriculomegalia por um examinador sem experiência em neurossonografia englobam condições como:

  • Holoprosencefalia;
  • Hidranencefalia;
  • Porencefalia;
  • Esquizencefalia e diversas anomalias císticas, como os cistos aracnóides.

Cada uma dessas condições possui características específicas em exames de imagem e avaliação clínica que permitem o diagnóstico diferencial.

A hidrocefalia é um acúmulo anormal de líquido cefalorraquidiano (LCR) no cérebro, que pode levar à dilatação dos ventrículos. Pode ser comunicante (com fluxo normal do LCR) ou obstrutiva (com bloqueio do fluxo do LCR). É importante diferenciar a hidrocefalia da ventriculomegalia, pois a hidrocefalia geralmente requer intervenção cirúrgica para drenagem do LCR.

Alguns tipos de malformações vasculares no cérebro, como malformações arteriovenosas, podem afetar o fluxo sanguíneo cerebral e, indiretamente, levar à dilatação dos ventrículos.

Hidrocefalia fetal com 21 semanas de gestação. Fonte: Cortesia de Ana Monteagudo, MD.

Associações com outras anomalias congênitas 

A ventriculomegalia, ou dilatação dos ventrículos cerebrais, pode estar associada a várias outras anomalias congênitas e condições médicas. Aqui estão algumas das associações mais comuns:

  1. Anomalias do Sistema Nervoso Central (SNC)
  • Agenesia do corpo caloso: A ventriculomegalia pode ocorrer como parte desta anomalia.
  • Holoprosencefalia: Uma condição em que o cérebro não se divide corretamente durante o desenvolvimento embrionário.
  • Esquizencefalia: Caracterizada por fendas no cérebro.
  • Hidranencefalia: A quase completa ausência de hemisférios cerebrais, com fluido cerebroespinhal ocupando o espaço.
  • Porencefalia: A presença de cavidades preenchidas com líquido no cérebro.

   2. Anomalias Genéticas:

  • Síndrome de Down (Trissomia do 21): Pacientes com Síndrome de Down têm um risco ligeiramente aumentado de ventriculomegalia.
  • Síndrome de Edwards (Trissomia do 18): Uma condição genética associada a diversas anomalias congênitas, incluindo ventriculomegalia em alguns casos.
  1. Infecções Congênitas:
  • Infecções durante a gravidez, como a toxoplasmose, citomegalovírus (CMV) e rubéola, podem causar ventriculomegalia no feto.
  1. Hemorragia Intracraniana:
    • Lesões hemorrágicas no cérebro fetal podem levar à ventriculomegalia, especialmente em casos de trauma fetal.
  2. Malformações Vasculares: 
  • Malformações arteriovenosas e outras anomalias vasculares podem afetar o fluxo sanguíneo cerebral e causar dilatação dos ventrículos.
  1. Hidrocefalia:
    • A hidrocefalia, que é a acumulação anormal de líquido cefalorraquidiano no cérebro, pode causar ventriculomegalia.
  2. Anomalias Renais: 
    • Alguns distúrbios renais congênitos, como a síndrome de Potter, estão associados a ventriculomegalia.
  3. Anomalias Cardíacas:
    • Crianças com anomalias cardíacas congênitas, como a estenose aórtica, podem apresentar ventriculomegalia.

A ventriculomegalia pode ser uma característica isolada ou uma parte de uma síndrome ou anomalia mais complexa

Portanto, quando a ventriculomegalia é identificada durante a gravidez ou após o nascimento, é fundamental realizar uma avaliação completa para determinar as possíveis associações com outras anomalias congênitas e condições subjacentes. 

Isso ajudará no planejamento do tratamento e na orientação dos pais sobre o prognóstico e as opções de cuidados médicos.

Leia também: Por que fazer uma especialização médica com o Cetrus?

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Referências 

  1. Ventriculomegalia fetal leve: diagnóstico, avaliação e conduta. Fetalmed. 
  2. Ventriculomegalia cerebral fetal. Mary E Norton, MD. UpToDate

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