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Conheça as diretrizes práticas da ISUOG para restrição de crescimento fetal

Conheça as diretrizes práticas da ISUOG para a avaliação da restrição de crescimento fetal. Boa leitura! 

A restrição de crescimento fetal (RCF) é uma condição delicada e crucial no acompanhamento pré-natal, impactando diretamente a saúde do feto e da gestante. A International Society of Ultrasound in Obstetrics and Gynecology (ISUOG) oferece diretrizes clínicas e práticas fundamentais para a identificação precoce, diagnóstico e manejo da RCF. 

Com base nessas orientações especializadas, médicos obstetras e especialistas em ultrassonografia são capacitados a detectar e intervir em casos de crescimento fetal inadequado, melhorando os resultados perinatais e orientando estratégias de cuidados específicos. 

Neste contexto, explorar e compreender as diretrizes práticas da ISUOG é fundamental para a prática clínica eficiente e a prestação de cuidados de qualidade durante a gestação.

O que constitui a restrição de crescimento fetal (RCF) e os métodos diagnósticos utilizados para identificá-la

A restrição de crescimento fetal (RCF) ocorre quando o feto não atinge seu potencial de crescimento esperado para sua idade gestacional, resultando em um desenvolvimento abaixo do esperado em termos de tamanho e peso. 

Isso pode ser indicativo de problemas de saúde tanto para o feto quanto para a gestante, demandando uma intervenção cuidadosa e vigilância médica.

Para identificar a RCF, os profissionais de saúde utilizam diferentes métodos diagnósticos, sendo a ultrassonografia uma ferramenta fundamental nesse processo. 

Por meio da ultrassonografia obstétrica, é possível realizar uma avaliação detalhada do crescimento fetal, medindo parâmetros biométricos como circunferência abdominal, diâmetro biparietal, comprimento do fêmur e estimativa do peso fetal.

Essa técnica de imagem é crucial para detectar sinais de RCF, pois permite uma avaliação em tempo real do desenvolvimento fetal ao longo da gestação. Além disso, a ultrassonografia possibilita a comparação dos parâmetros medidos com as curvas de crescimento normais para a idade gestacional, facilitando a identificação de qualquer desvio significativo.

Ao destacar a ultrassonografia como uma ferramenta de diagnóstico essencial, fica evidente sua importância na detecção precoce da restrição de crescimento fetal, permitindo intervenções oportunas e um cuidado adequado para garantir a saúde tanto do feto quanto da gestante.

Diretrizes da ISUOG para a restrição do crescimento fetal (RCF)

As Diretrizes resumem bem a definição de fetos adequados para a idade gestacional (AIG), pequenos para a idade gestacional (PIG) e fetos grandes para a idade gestacional (GIG). 

Fetos AIG e PIG

Fetos com crescimento adequado (AIG) têm tamanho considerado normal para a idade gestacional, com parâmetros biométricos geralmente entre os percentis 10 e 90. 

Já os fetos pequenos para a idade gestacional (PIG) têm peso ou circunferência abaixo do 10º percentil, podendo ser ainda menores que o 5º, 3º ou até 2 desvios padrões abaixo da média, conforme relatos anteriores. 

Quando ocorre a restrição de crescimento fetal?

A restrição de crescimento fetal (RCF) ocorre quando o feto não alcança seu potencial de crescimento. Pode ser classificada como precoce (antes de 32 semanas) ou tardia (após 32 semanas). 

É importante notar que fetos com RCF não necessariamente serão PIG ao nascer. Alguns podem ter dificuldades de crescimento sem serem considerados PIG. Além disso, nem todos os fetos PIG têm restrição de crescimento; alguns são naturalmente menores.  

Feto GIG 

O feto grande para a idade gestacional (GIG) apresenta medidas acima do 90º percentil, sendo o peso usualmente superior a pontos fixos de corte, como 4000 ou 4500 g para referência de macrossomia ao nascimento.

Simetria do corpo fetal e a restrição do crescimento fetal 

Tradicionalmente, a simetria do corpo fetal foi associada à causa subjacente da RCF, com a simetria correspondendo à aneuploidia fetal e a assimetria a problemas placentários

Contudo, anormalidades cromossômicas podem apresentar padrões assimétricos de crescimento e a insuficiência placentária pode ter padrões simétricos. Além disso, a simetria do corpo não é um indicador consistente de prognóstico.

Recomendações das diretrizes

As diretrizes recomendam que as siglas acima (AIG, PIG e GIG) sejam aplicadas em laudos médicos, relatórios e prontuários, considerada uma boa prática médica. 

Ainda, como nível de recomendação C, os termos “início precoce” (detectado antes de 32 semanas de gestação) e “início tardio” (detectado após 32 semanas de gestação) pode ser adicionado nos casos de CFR. 

Como nível de recomendação D, os termos CFR “simétrico” e “assimétrico” não devem mais ser utilizados, pois eles não fornecem informações adicionais em relação à etiologia ou prognóstico. 

Consenso para definição de crescimento intrauterino restrito (CIUR) precoce e tardio sem anormalidades congênitas. Fonte: Gordijn et al. 

Medidas fetais principais: o que, quando e como medir?

Os ultrassonografistas fetais devem possuir treinamento especializado em ultrassom obstétrico, garantindo a segurança durante o procedimento, respeitando o princípio ALARA (“as low as reasonably achievable” que corresponderia a “o mínimo necessário”). 

Os equipamentos utilizados devem possuir transdutores bidimensionais (2D), capacidade de zoom, registros precisos e manutenção regular.

Procedimento

Durante o procedimento, medidas como a circunferência cefálica devem ser feitas antes das 14 semanas. Após essa fase gestacional, incluem-se outras medidas como diâmetro biparietal, circunferência abdominal e comprimento do fêmur. A qualidade das imagens é fundamental para a colocação correta dos marcadores eletrônicos.

É importante destacar que medidas podem ser feitas por via transabdominal ou transvaginal, exigindo imagens claras e devidamente magnificadas para uma avaliação precisa.

Controle de qualidade

O controle de qualidade deve ser constante. É recomendada a utilização de métodos consistentes dentro de uma instituição, preferencialmente adotando o método de elipse para medidas como circunferência cefálica e abdominal, garantindo a uniformidade nos estudos e nas curvas de referência utilizadas.

Recomendações 

As recomendações podem ser resumidas como: 

  • DBP, CC, CA e CF devem ser medidos no ultrassom a partir de 14 semanas (Grau D de recomendação), como mencionamos acima; 
  • A circunferência cefálica (CC) e abdominal (CA) devem ser obtidas utilizando o método de elipse, colocando os calipers no bordo externo na circunferência do tecido, considerada boa prática médica.
    As medidas devem ser realizadas seguindo a mesma metodologia dos estudos que produzem as curvas de referências adotadas no hospital ou sistema utilizado

Peso fetal estimado (PFE): entenda o que as diretrizes da ISUOG abordam 

O peso fetal estimado (PFE) é uma ferramenta útil para acompanhar o crescimento fetal, permitindo aos profissionais sintetizar o desenvolvimento com base em parâmetros específicos, como o peso. 

No entanto, seu uso apresenta desvantagens, como erros multiplicados nos parâmetros, variabilidade na precisão (10-15%) e dificuldades técnicas na medição de certos parâmetros.

Devido às imprecisões na estimativa do peso, é recomendável um intervalo de pelo menos 3 semanas entre os exames para minimizar falsos positivos na detecção de alterações no crescimento fetal. Apesar disso, em situações clínicas específicas, podem ser necessários exames ultrassonográficos mais frequentes. 

É fundamental comparar o PFE com nomogramas dedicados a essa finalidade, evitando comparações com gráficos de peso de recém-nascidos, que incluem principalmente fetos com restrição de crescimento nascidos prematuramente.

Recomendações 

Considerado como grau C de recomendação, O PFE não deve ser comparado com gráficos de peso de nascimento de recém-nascidos. Enquanto isso, parâmetros de tamanhos anatômicos individuais devem ser interpretados com cuidado.

Quando o PFE é computado, o valor calculado deve ser interpretado baseado em nomogramas existentes.

Como realizar o controle das medidas biométricas fetais?

O controle de qualidade na medição da biometria fetal é crucial para auditoria e monitoramento. Uma estratégia abrangente de controle de qualidade inclui armazenamento, revisão de imagens e avaliação da precisão entre diferentes observadores. 

É fundamental que diretrizes nacionais e locais promovam métodos padronizados de aquisição e posicionamento dos calipers, o que demonstrou melhorar a confiabilidade das medições.

Para garantir a qualidade das medidas, critérios de pontuação podem ser aplicados às imagens do tamanho craniano, circunferência cefálica, circunferência abdominal e comprimento do fêmur, conforme descrito em uma tabela específica. 

Além disso, é possível avaliar a precisão dos dados por meio da reprodutibilidade intraobservador (pelo mesmo operador) e interobservador (por diferentes operadores) no posicionamento dos calipers.

Por fim, a análise da distribuição das medidas também é uma etapa importante nesse controle de qualidade.

Recomendações 

  1. Imagens biométricas devem passar por checagem de controle de qualidade rotineiramente; 
  2. As diretrizes nacionais devem ser seguidas. Processos de controle de qualidade devem incluir:
    • Revisão de imagens;
    • Realização de controle de qualidade em uma seleção aleatória de pelo menos 10% das imagens armazenadas para reprodutibilidade interobservador, posicionando os calipers nas imagens armazenadas, e reprodutibilidade intraobservador, com nova aquisição das imagens e posicionamento dos calipers pelo mesmo operador;
  3. Os operadores devem passar por reciclagem se as imagens estiverem com pouca qualidade. As medidas estiverem constantemente fora de 95% dos limites de concordância ou distribuição do escore Z diferente dos valores esperados. 

Intervalos de referências de medidas biométricas e padrão de crescimento 

É crucial entender a diferença entre intervalos de referência descritivos e padrões de crescimento estabelecidos. 

Os intervalos de referência descrevem a distribuição de medidas em uma população em um período específico, mas apenas alguns são metodologicamente robustos. Já os padrões de crescimento delineiam o crescimento ideal em condições ótimas, oferecendo expectativas para gestantes e populações saudáveis.

A comparação com os padrões de populações saudáveis é comum na medicina para analisar casos individuais, mas pode variar em populações de alto risco para anomalias de crescimento. 

Esses padrões são baseados em dados prospectivos de alta qualidade, com amostras predefinidas de diferentes regiões geográficas, protocolos de ultrassom e controle de qualidade bem estabelecidos.

É fundamental que os resultados gestacionais sejam abrangentes, visando à menor incidência possível de complicações gestacionais.

Critérios para avaliação objetiva, baseada em escore, da qualidade das imagens biométricas. Fonte:Gordijn et al.

A diferenciação entre intervalos de referência descritivos e padrões de crescimento estabelecidos é crucial. 

Os padrões determinados delineiam o crescimento ideal em condições ótimas, enquanto os intervalos de referência descrevem a distribuição de medidas em uma população em um tempo específico.

Importância de padrões pré-definidos

As diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS) são fundamentais ao criar padrões de crescimento. Elas envolvem seleção cuidadosa da população estudada, incluindo dados sobre antropometria neonatal, condições perinatais e avaliação pós-natal do desenvolvimento motor. É necessário padronizar procedimentos, equipamentos e equipes bem treinadas.

O equipamento de ultrassonografia deve seguir critérios pré-definidos, com múltiplas medidas para corroborar com a antropometria neonatal. Estratégias de controle de qualidade envolvem treinamento, padronização e certificação dos operadores, monitoramento de dados e repetição de medidas.

Diferentes tabelas de referência podem reportar diferentes percentis para a mesma medida fetal, resultando de diferenças metodológicas na sua criação. 

Construção de padrões internacionais da biometria fetal

A construção de padrões internacionais da biometria fetal considera populações multicêntricas, multiétnicas, de baixo risco para resultados adversos maternos e perinatais, refletindo melhor a prática clínica moderna. 

Tabelas customizadas consideram variáveis como altura e peso materno, origem étnica, paridade e sexo fetal, podendo mostrar uma proporção diferente de fetos PIG ao nascimento. No entanto, o benefício dessa abordagem sobre os gráficos baseados na população não foi plenamente demonstrado.

Essas são diretrizes fundamentais na criação de padrões de crescimento fetal, visando uma avaliação mais precisa e abrangente durante a gestação e pós-natal.

Recomendações

  • Tabelas de biometria fetal que devem ser utilizadas deverão ser determinadas, obtidas prospectivamente, realmente baseada na população e derivadas de estudos com o menor viés metodológico possível;
  • Avaliação de rotina do número (%) de fetos considerados com crescimento anormal (abaixo de um certo corte) deve ser realizado;
  • Os profissionais devem saber as tabelas obrigatórias locais ou nacionais. 

Documentação de medidas segundo as Diretrizes da ISUOG 

Os laudos de crescimento fetal devem conter informações cruciais como as condições médicas relevantes, indicação da ultrassonografia, data do exame e idade gestacional estimada

Medidas como DBP, CC, CA e CF são essenciais, assim como o PFE em gramas, gráficos de parâmetros e resultados de exames relevantes para impressão diagnóstica e recomendações de seguimento.

Além dos parâmetros convencionais de crescimento, como BPD e CF, a avaliação de órgãos como o fígado e a quantidade de tecidos moles é vital para a compreensão do estado nutricional fetal. 

Uso da ultrassonografia tridimensional

O uso da ultrassonografia tridimensional (3D) tornou mais viável a avaliação da gordura e dos músculos do feto. Essas medições complementares têm mostrado ser indicadores precisos do estado nutricional fetal, melhorando a detecção de CIUR tardio.

Referências em ressonância magnética

Curvas de referências em ressonância magnética (RNM) têm sido desenvolvidas para várias estruturas anatômicas, mas a baixa concordância interobservador requer refinamento na técnica. 

Estudos comparando a precisão da RNM com a ultrassonografia para predição de macrossomia neonatal não fornecem evidências suficientes para considerar a RNM mais precisa.

Áreas futuras

Áreas futuras de pesquisa incluem o estudo de fetos individualmente, usando parâmetros anatômicos adicionais para compreender as anormalidades de crescimento. 

Estudos longitudinais e a avaliação funcional da placenta são fundamentais para prever resultados adversos em fetos com crescimento atípico.

Leia também: Por que fazer uma especialização médica com o Cetrus?

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Referências 

  1. Diretrizes práticas ISUOG: avaliação ultrassonografica da biometria e crescimento fetal.