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Protocolo Blue: avaliação ultrassonográfica na Insuficiência Respiratória Aguda

Tudo que você precisa saber sobre o Protocolo Blue. Acesse e confira como realizar a avaliação por ultrassonografia na insuficiência respiratória aguda!

A insuficiência respiratória aguda é uma condição clínica desafiadora que requer diagnóstico rápido e preciso para uma intervenção eficaz. O uso da ultrassonografia point-of-care tem ganhado destaque como uma ferramenta valiosa na avaliação desses pacientes, fornecendo informações anatômicas e funcionais em tempo real. 

O Protocolo Blue, uma abordagem sistematizada de ultrassonografia para avaliar a insuficiência respiratória aguda, tem sido amplamente adotado por médicos especialistas devido à sua eficácia na tomada de decisões clínicas.

Insuficiência respiratória aguda

A insuficiência respiratória aguda é uma condição médica grave caracterizada pela incapacidade do sistema respiratório em manter níveis adequados de oxigênio (O2) e dióxido de carbono (CO2) no sangue arterial. Essa disfunção respiratória pode ocorrer repentinamente, levando a uma alteração significativa nos gases sanguíneos e, em casos mais graves, à instabilidade hemodinâmica.

Tipos da insuficiência respiratória aguda

As causas da insuficiência respiratória aguda podem ser divididas em duas categorias principais com base no desequilíbrio gasométrico:

Hipoxêmica (Tipo 1)

Nesse tipo, a pressão parcial de oxigênio (PaO2) no sangue arterial está abaixo dos valores normais, enquanto a pressão parcial de dióxido de carbono (PaCO2) permanece dentro dos limites normais ou levemente elevada. 

Causas comuns incluem pneumonia grave, edema pulmonar, embolia pulmonar e síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA).

Hipercápnica (Tipo 2)

Aqui, a PaCO2 no sangue arterial está elevada, indicando dificuldade em eliminar adequadamente o CO2. 

Causas incluem doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) grave, insuficiência cardíaca congestiva, miastenia grave e outras doenças neuromusculares.

Protocolo Blue

O Protocolo Blue, protocolo Bedside Lung Ultrasoud in Emergency (BLUE) – ultrassom pulmonar à beira do leito em situações de emergência, refere-se a uma abordagem sistemática de ultrassonografia point-of-care ultrasound usada para avaliar pacientes com insuficiência respiratória aguda. 

Indicações do protocolo blue

O protocolo BLUE é usado principalmente em situações de emergência e terapia intensiva, onde pacientes apresentam sinais de insuficiência respiratória aguda e precisam de diagnóstico e tratamento imediatos.

Causas investigadas 

Esse protocolo é utilizado para identificar diversas condições pulmonares que podem contribuir para a insuficiência respiratória, como:

  • Pneumotórax
  • Pneumonia
  • Edema pulmonar
  • Congestão pulmonar
  • DPOC/Asma
  • Tromboembolismo pulmonar (TEP)
  • Hemotórax. 

Benefícios do protocolo blue

O Protocolo Blue oferece diversos benefícios aos médicos especialistas na avaliação de pacientes com insuficiência respiratória aguda:

  • Rapidez e Eficiência: A ultrassonografia é uma ferramenta de diagnóstico em tempo real, permitindo uma avaliação imediata e precisa das condições respiratórias.
  • Redução de Radiação: Em comparação com outros métodos de imagem, a ultrassonografia não envolve exposição à radiação ionizante, tornando-a uma opção mais segura, especialmente em pacientes vulneráveis.
  • Monitoramento Dinâmico: A avaliação ultrassonográfica pode ser repetida ao longo do tempo para monitorar a progressão ou resposta ao tratamento.
  • Suporte à Tomada de Decisões: O Protocolo Blue fornece informações objetivas que auxiliam na definição do diagnóstico e na escolha da terapia mais adequada.

Apesar da sua grande capacidade de diagnóstico, é um exame operador dependente que precisa de um profissional habilitado para interpretar seus resultados.

Achados da ultrassonografia pulmonar e o protocolo blue

No protocolo blue o médico que está realizando o exame ultrassonográfico deve avaliar 4 ítens: 

  • Artefatos: linhas horizontais A e linhas verticais B
  • Deslizamento pleural (lung point)
  • Consolidação e/ou derrame pleural
  • E ainda deve-se fazer a análise de pesquisa venosa para investigar TVP

Áreas examinadas e passo a passo para realização do exame ultrassonográfico

Pode-se utilizar dois tipos de transdutor para a realização do exame. Ou o convexo ou o linar. 

O paciente deve ser posicionado na posição semifletida ou supina. Nesse momento, deve realizar a varredura longitudinal seis regiões do hemitórax do paciente, mostrado na imagem abaixo:  

Posicionamento do paciente para o exame, referências anatômicas e regiões avaliadas. A: Decúbito dorsal horizontal. B: Decúbito lateral esquerdo. LPS, linha paraesternal; LAA, linha axilar anterior; LAP, linha axilar posterior. 1, região anterossuperior; 2, região anteroinferior; 3, região lateral superior; 4, região lateral inferior; 5, região posterossuperior; 6, região posteroinferior. Fonte: OLIVEIRA et al, 2020.

Linhas A (pulmão aerado)

As linhas A representam artefatos de reverberação e aparecem como linhas paralelas horizontais equidistantes de cada uma. Essas linhas são comumente vistas em indivíduos saudáveis podendo estar apagadas (por linhas B) ou realçadas (na presença de pneumotórax). 

Linhas A. Fonte: FRANCISCO NETO, 2016.

Linhas B (infiltrado intersticial)

As linhas B são padrões ultrassonográficos que indicam envolvimento dos tecidos entre os alvéolos pulmonares. 

Elas podem estar presentes em condições de espessamento das estruturas internas do pulmão, como fibras ou alterações nos alvéolos. Normalmente, até duas linhas B por área visualizada podem ser normais. Quando são observadas três ou mais linhas B entre as costelas, isso é chamado de “Sinal de Foguetes Pulmonares”.

Presença de linhas B patológica (mais que 3 linhas) à esquerda, e edema intersticial com presença de linhas B à direita . Fonte: Relevance of Lung Ultrasound in the Diagnosis of Acute Respiratory Failure, 2008 in POCUS USP.

As linhas B aparecem como pequenos artefatos verticais semelhantes a caudas de cometa, surgindo da linha pleural. Elas se movem junto com a linha pleural durante a respiração e podem apagar as chamadas linhas A. 

Linhas B. Fonte: FRANCISCO NETO, 2016.

Deslizamento pleural 

O deslizamento pleural é um fenômeno observado durante o exame de ultrassonografia pulmonar, que ocorre devido à mobilidade das linhas pleurais durante o ciclo respiratório. Essas linhas pleurais são as interfaces entre o tecido pulmonar e a parede torácica.

Durante a respiração, o movimento rítmico dos pulmões faz com que as linhas pleurais deslizem suavemente uma sobre a outra. Esse deslizamento é visível na imagem de ultrassom como uma área brilhante que se move em relação à imagem subjacente. Esse padrão de deslizamento é considerado um sinal de pulmão saudável e sem pneumotórax.

A pleura visceral desliza sobre a pleura parietal e forma o que conhecemos como Sinal da Areia na Praia, quando o ultrassom está no modo M.

Sinal da praia. Fonte: Oliveira et al, 2020

Quando não há deslizamento entre as pleuras, vemos o que chamamos de Sinal de Estratosfera, também com o US em modo M. 

Sinal da Estratosfera. Fonte: vídeoaula Cetrus

Lung Point 

O “Lung Point” (ponto pulmonar) é um termo utilizado na ultrassonografia pulmonar, especialmente no contexto de pneumotórax. Ele se refere a um achado ultrassonográfico característico que ocorre quando se examina a linha pleural de um paciente com pneumotórax parcial.

Quando um pneumotórax parcial está presente, ou seja, quando há um acúmulo de ar entre as camadas da pleura que não envolve todo o pulmão, a interface entre o pulmão colapsado e o pulmão não afetado pode ser visualizada em uma imagem ultrassonográfica. Essa interface é conhecida como o “Lung Point”.

O Lung Point é um ponto de transição entre a área onde o pulmão está tocando a parede torácica (sem ar) e a área onde o pulmão não está em contato com a parede torácica (com ar). A identificação do Lung Point na ultrassonografia é altamente indicativa de pneumotórax parcial, indicando o local onde o pulmão parcialmente colapsado e o pulmão não colapsado se encontram.

Essa característica é valiosa para auxiliar no diagnóstico de pneumotórax parcial, especialmente em situações onde o diagnóstico clínico pode ser desafiador.

Vale ressaltar que o Lung Point não estará presente em todos os casos de pneumotórax parcial, e sua identificação requer treinamento adequado em ultrassonografia pulmonar para evitar confusões com outros achados ultrassonográficos.

Lung Point. Fonte: Vídeoaula Cetrus

Consolidação alveolar

A consolidação alveolar é um termo que se refere a uma alteração nos pulmões na qual os alvéolos, que normalmente são preenchidos com ar, ficam cheios de líquido, células inflamatórias e outros detritos. Isso leva a uma perda da aeração normal dos alvéolos e pode resultar em uma área do pulmão que parece mais densa na radiografia ou no exame de ultrassonografia.

Na ultrassonografia, a consolidação alveolar pode ser visualizada como uma área hipoecóica, ou seja, uma área mais escura em relação ao pulmão circundante. Essa área escura indica que há algo presente nos alvéolos que está impedindo a passagem adequada do som ultrassônico, geralmente líquido ou material sólido.

A consolidação alveolar pode ser causada por várias condições, incluindo pneumonia bacteriana ou viral, broncopneumonia, edema pulmonar, entre outras. 

US de tórax em paciente com a COVID-19 demonstra pequenas consolidações subpleurais hipoecogênicas, irregulares e de morfologia redonda (setas). De suas extremidades posteriores partem as linhas C pleurais (asteriscos), que são hiperecogênicas e verticais, à semelhança das linhas B.” Fonte: Oliveira et, al. 2020

Derrame pleural 

Já o derrame pleural é uma condição em que há acúmulo anormal de líquido entre as camadas da pleura, que é a membrana que reveste os pulmões e a parede interna da cavidade torácica. Esse líquido pode ser seroso, sanguinolento ou purulento, e sua presença pode comprometer a função pulmonar.

Na ultrassonografia, o derrame pleural é visualizado como uma área anecóica, ou seja, uma área escura que indica a presença de líquido. Esse líquido aparece como uma área preta na imagem ultrassonográfica devido à sua capacidade de não refletir o som ultrassônico.

O exame ultrassonográfico pode fornecer informações valiosas sobre o derrame pleural, como a quantidade e a localização do líquido, bem como a presença de septos (partições) no derrame. Essas informações auxiliam os médicos na avaliação da causa do derrame e na determinação do tratamento adequado.

 Corte ultrassonográfico no terço inferior do hemitórax direito. Atelectasia (seta vermelha) e derrame pleural (seta amarela). Fonte: Oliveira et al, 2020

Perfis das possíveis etiologias para a insuficiência respiratória aguda pelo protocolo Blue

Através do protocolo Blue é possível identificar sete perfis de achados ultrassonográficos que representam uma possível etiologia para a insuficiência respiratória aguda.

  • Perfil A: presença de linhas A anteriores e de deslizamento pleural – DPOC, ASMA, EMBOLIA PULMONAR (associado à TVP)
  • Perfil A’: linhas A anteriores presentes, mas sem deslizamento pleural – PNEUMOTÓRAX (+ presença de lung point)
  • O Perfil B: presença de linhas B anteriores e de deslizamento pleural – EDEMA PULMONAR
  • Perfil B’: linhas B anteriores presentes, mas sem deslizamento pleural  – PNEUMONIA
  • Perfil AB: linhas A anteriores e B anteriores presentes – PNEUMONIA
  • O Perfil C: consolidação alveolar anterior  – PNEUMONIA
  • PLAPS: síndrome pleural e/ou alveolar póstero-lateral. Presença de consolidação e derrame pleural  – PNEUMONIA

O fluxograma do protocolo pode ser observado na imagem abaixo:

Fluxograma dos perfis pelo protocolo Blue. Fonte: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3734893/

Videoaula do protocolo blue: aprenda na prática a analise da imagem ultrassonográfica

A Dra Cibele Alvarenga, Coordenadora de cursos de Ultrassonografia do CETRUS, apresenta um material complementar referente à Ultrassom Pulmonar.

Neste conteúdo, você terá a oportunidade de identificar como efetuar diagnósticos diferenciais diante de pacientes com o quadro de Insuficiência Respiratória Aguda, utilizando o Protocolo Blue.

Pós-Graduação Lato Sensu em Ultrassonografia em Emergências e UTI – Point of care

Profissionais médicos especializados em emergência ou terapia intensiva que possuem habilidades em ultrassonografia point-of-care (POCUS) têm uma ferramenta valiosa para diagnósticos rápidos e decisões imediatas que podem salvar vidas.

Nesse sentido, o Cetrus possui um programa de Pós-Graduação focado em Ultrassonografia em Emergências e UTI – Point-of-care, com uma considerável quantidade de atividades práticas, permitindo que os participantes apliquem essas intervenções em suas práticas clínicas diárias.

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Referências

  1. FRANCISCO NETO, M. J. et al. Advances in lung ultrasound. Einstein. 2016;14(3):443-8
  2. LICHTENSTEIN, D. A. BLUE-Protocol and FALL-Protocol: Two Applications of Lung Ultrasound in the Critically III. CHEST Journal. Volume 147, Issue 6, P1659-1670, June 2015. 
  3. OLIVEIRA, R. R. et al. Ultrassonografia pulmonar: uma ferramenta adicional na COVID-19. Radiologia Brasileira, CBR. Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (InRad/HC-FMUSP), São Paulo, SP, Brasil, 2020

Questões comentadas sobre o protocolo blue e a análise ultrassonografáfica da insuficiência respiratória aguda

Confira no vídeo abaixo questões sobre o tema para reforçar ainda mais o seu aprendizado:

15 Replies to “Protocolo Blue: avaliação da insuficiência respiratória aguda”

  1. Que delícia de aula!!!! Estava com saudades!! Obrigada por dividir conosco seus conhecimentos, Ci!
    Obrigada a todos os professores do Cetrus pelo empenho nesse momento tão complicado .. Beijos a todos.

  2. Aula muito boa, bem explicada e detalhada. Parabéns a todos os envolvidos!

  3. Por favor, tenho uma dúvida sobre o protocolo Blue. A pesquisa de TVP é só na área do parênquima pulmonar? Ou se achar nos membros inferiores inclui. No pulmão, qual o local melhor de visualização?

    1. Pesquisa de tvp sempre muito rápida e incluindo se principalmente veias musculares da panturrilha q podem passar despercebidas. Na prática clínica tvp de mmss e jugulares são excepcionalissimas. Usar PRF alto persistência baixa .

    2. Olá Gislany, tudo bem?

      Primeiramente gostaria de agradecer por seu elogio com relação à aula. Fico muitooo feliz com isso, como também com sua interação com relação ao tema!
      É muito importante para nós essa comunicação, como também o esclarecimento de dúvidas que possam surgir durante as aulas!!! Fique sempre à vontade em perguntar! Estou aqui à disposição para responder quaisquer dúvidas!!

      Quanto à sua pergunta sobre a pesquisa de TVP, segue a resposta: a pesquisa de trombose venosa profunda deve ser feita principalmente em veias dos membros inferiores
      (veia femoral comum, profunda e superficial, veia poplítea, veias da panturrilha (gastrocnemias e soleares), veia tibial posterior, veia fibular e quando necessário veia tibial anterior), veias ilíacas e quando possível
      veia cava inferior. As veias de membros superiores e veias jugulares também devem ser pesquisadas, principalmente se esse paciente tiver presença de cateter, porem em uma ordem de frequência as veias de membros inferiores
      são as mais acometidas.

      A pesquisa de TVP deve ser feita com a manobra de compressão do transdutor, no corte transversal das veias.
      O colabamento total da veia se faz necessário, para se confirmar que não há trombos dentro do vaso pesquisado.

      No protocolo BLUE não fazemos a pesquisa direta de trombos (êmbolos) em veias pulmonares, uma vez que o ultra-som não consegue ter acesso a essas veias.
      Seria necessário um outro método de imagem para avaliar diretamente essas veias. O diagnóstico de embolia pulmonar pelo ultra-som , em um paciente com quadro de insuficiência respiratória aguda,
      se dá por achados indiretos como: trombos em veias que citei acima, associado a um PERFIL A ( presença de linhas A anteriores + lung slide presente).

      Um grande abraço!!
      Cibele

  4. Excelente aula! Muito didática e esclarecedora! Obrigada equipe Cetrus!

  5. Excelente aula! Muito didática e esclarecedora! Obrigada equipe Cetrus!

    1. Excelente ideia de repassar conhecimentos dessa área que desconhecida muitos de nós que trabalhamos com imagem.

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