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Técnica de acesso vascular guiado por USG: o que preciso saber para prática?

O acesso vascular é uma parte essencial da prática médica em uma variedade de configurações, incluindo hospitais, unidades de terapia intensiva, salas de cirurgia, clínicas e serviços de emergência. 

Um acesso vascular adequado e bem mantido é crucial para garantir a administração eficaz de tratamentos, monitorar a condição do paciente e obter amostras de sangue para análises diagnósticas.

Entretanto, apesar de ser uma técnica corriqueira e de grande importância, nem sempre a sua execução é feita com facilidade e de forma correta, ocorrendo diversas tentativas o que pode levar à complicações para o paciente.

O uso do ultrassom para guiar o acesso vascular tem sido de grande valia para o médico e paciente. Além de reduzir o número de tentativas, reduz ainda as complicações e melhora a efetividade da excução, principalmente no paciente gravemente doente. 

Continue a leitura e saiba como utilizar a ultrassonografia para colocação de cateteres venosos centrais, periféricos, intraósseos e até fístula arteriovenosa. 

Acesso vascular: o que é?

O acesso vascular refere-se à obtenção de acesso ao sistema vascular do corpo humano para várias finalidades médicas. Isso envolve a inserção de um dispositivo médico, como um cateter ou agulha, em um vaso sanguíneo para permitir a administração de fluidos, medicamentos, nutrição parenteral, coleta de amostras de sangue, monitorização hemodinâmica ou para outros fins diagnósticos ou terapêuticos.

Assim, o acesso vascular pode ser de diferentes tipos, dependendo do local de inserção e da finalidade do acesso. 

Tipos de acesso vascular

Existem alguns tipos de acesso vascular, cada uma com suas características específicas e indicações clínicas. São eles:

  • Acesso venoso periférico
  • Acesso vascular intraósseo
  • Fístula arteriovenosa
  • Acesso venoso central 

Abaixo falaremos sobre cada um, do seu uso e como o ultrassom pode auxiliar no emprego desta técnica. 

Acesso venoso periférico

O acesso venoso periférico refere-se à inserção de uma agulha ou cateter em uma veia periférica do corpo humano, geralmente calibrosas, que pode ser dos membros superiores ou inferiores, sendo a primeira mais preferível por ter menos complicações e ser mais duradoura. 

A escolha de qual veia escolher vai depender do tipo de cirurgia, a idade do paciente, o conforto do mesmo e a situação no momento de realização da técnica. 

De forma geral, as veias mais utilizadas para este acesso vascular são as veias cubitais medianas, localizadas no antebraço. Caso não seja possível puncioná-la, pode-se lançar mão das meias dos pés ou veias safenas nos membros inferiores. Em crianças, em alguns casos, é necessário pegar as veias do couro cabeludo. 

Indicações do acesso venoso periférico

Este tipo de acesso vascular é indicado para:

  • Administração de medicamentos 
  • Fluidos intravenosos
  • Coleta de sangue 
  • Procedimentos simples. 

Contraindicações e complicações

As principais contraindicações do acesso venoso periférico são:

  • Infecção
  • Flebite
  • Esclerose de veias
  • Infiltração intravenosa prévia
  • Queimaduras
  • Lesões traumáticas no local 
  • Fístula arteriovenosa no membro a ser realizado o procedimento. 

Em caso de pacientes em choque, com hipovolemia, desidratação intensa, entre outras situações, pode ser difícil fazer o acesso periférico, sendo necessário escolher outra técnica mais invasiva. 

Em relação às complicações, podemos citar: 

  • Hematoma
  • Infecção bacteriana
  • Extravasamento de fluidos e drogas
  • Flebite
  • Trombose
  • Embolia
  • Lesão nervosa. 

Acesso vascular intraósseo

O acesso vascular intraósseo é uma técnica utilizada em situações de emergência para obter acesso rápido ao sistema vascular quando as vias venosas periféricas são difíceis ou impossíveis de acessar.

Nesse procedimento, insere-se uma agulha especial diretamente na medula óssea de um osso longo, como a tíbia proximal, tíbia distal, úmero proximal, crista ilíaca ântero-superior, esterno, rádio distal. 

Embora o acesso intraósseo não seja ideal para monitorização contínua, utiliza-se dele temporariamente até que um acesso venoso periférico ou central mais durável possa ser estabelecido. Após a estabilização do paciente, remove-se o acesso intraósseo.

Indicações do acesso vascular intraósseo

São indicadas em situação de emergência, que não seja possível realizar o acesso venoso periférico, e precisa ser muito rápido. A escolha entre ele e o acesso venoso central é que esta via costuma ser mais rápida. 

É utilizado principalmente em casos de choque, insuficiência respiratória e em parada cardíaca. Através dele pode ser administrado:

  • Drogas vasoativas por infusão contínua 
  • Coleta de sangue venoso
  • Administração de cristalóides, cristaloides, drogas e hemoderivados. 

Contraindicações e complicações

As principais contraindicações do acesso vascular intraósseo são:

  • Fratura em osso a ser puncionado
  • Presença de dispositivo ortopédico
  • Prótese no membro
  • Infecção de partes moles
  • Doenças ósseas. 

Não se deve realizar diversas tentativas. Caso não seja possível puncionar de primeira, não deve mais ocorrer nova punção devido ao risco de síndrome compartimental pelo extravasamento de fluidos em partes moles. Além dessa, fraturas ósseas e lesões de cartilagem também podem ser complicações do procedimento. 

Fístula arteriovenosa

Uma fístula arteriovenosa (FAV) é uma conexão anormal direta entre uma artéria e uma veia. Cria-se cirurgicamente para facilitar o acesso vascular em pacientes que necessitam de diálise ou outros tratamentos médicos que requerem acesso vascular de longo prazo.

Considare-se como padrão ouro para acesso vascular em pacientes submetidos a diálise devido à sua alta durabilidade, baixas taxas de complicações e menor risco de infecção quando comparadas a outras opções de acesso vascular, como cateteres venosos centrais. 

As fístulas arteriovenosas proporcionam um acesso vascular seguro e eficaz para tratamentos de longo prazo, melhorando a qualidade de vida e a sobrevida dos pacientes com insuficiência renal crônica.

Acesso venoso central 

O acesso venoso central refere-se à inserção de um cateter em uma veia de maior calibre, geralmente localizada perto do coração ou dentro do tórax, para permitir o acesso vascular de longo prazo. 

As veias mais utilizadas para a realização da pulsão são as veias jugulares internas, femoral e veia subclávia. As duas primeiras são preferenciais em crianças e a última, em adultos. 

Indicações do acesso venoso central 

O cateter venoso central é indicado para situações mais duradouras. Pacientes que ficarão internados por mais tempo, sendo necessária a monitorização contínua. É indicado ainda para:

  • Administração de vasopressores e soluções hipertônicas de bicarbonato de sódio e cálcio
  • Monitorização da pressão venosa central 
  • Coleta de amostra de sangue
  • Nutrição parenteral

Contraindicações e complicações

As principais contraindicações para o uso do acesso venoso central são:

  • Infecção na área de punção
  • Trombose da veia a ser utilizada
  • Coagulopatias 

As principais complicações são de origem mecânicas, infecciosas e tromboembólicas. Podemos citar: 

  • Tromboembolismo venoso;
  • Infecções
  • Embolia pulmonar
  • Lesão vascular e nervosa
  • Pneumotórax
  • Hemotórax
  • Arritmia

Ultrassom como guia para o acesso vascular

O uso do ultrassom, especialmente o Point-of-Care (POCUS), no acesso vascular oferece uma série de vantagens, incluindo uma melhor visualização das veias periféricas e centrais, aumento da taxa de sucesso na primeira tentativa, redução do tempo de procedimento, redução de complicações e maior confiança dos profissionais de saúde, tornando-o uma ferramenta valiosa em ambientes hospitalares e de emergência.

Confira abaixo como o ultrassom pode auxiliar em cada tipo de acesso vascular. 

Acesso venoso periférico

No local de atendimento, os profissionais podem utilizar a ultrassonografia para localizar veias periféricas para inserção de agulhas, sendo especialmente útil para identificar veias periféricas profundas que não são facilmente visíveis ou palpáveis.

A ultrassonografia tem a capacidade de determinar a localização precisa, profundidade e tamanho da veia antes da inserção da agulha (método estático).

Idealmente, o profissional pode realizar todo o procedimento de inserção da agulha sob orientação em tempo real por ultrassom (método dinâmico), permitindo a visualização da agulha enquanto penetra na veia e minimizando o risco de lesões em estruturas circundantes.

O método dinâmico geralmente é indicado quando houver dificuldade ou após duas tentativas fracassadas da técnica de referência. 

Uso do ultrassom no acesso vascular intraósseo e na fístula arteriovenosa

Utiliza-se o ultrassom também no acesso vascular intraósseo. Neste caso, utiliza-se o USG para confirmar a colocação da agulha intraóssea. 

No caso da fístula arteriovenosa, é sabido que a mesma possui muitos fatores de risco de falha. Por isso, desde 2019, a A Diretriz de Prática Clínica KDOQI para Acesso Vascular recomenda o uso do ultrassom previamente à realização do acesso vascular.

O ultrassom deve ser utilizado para fazer um mapeamento vascular. Com ele é possível medir o diâmetro e profundidade da veia, suas características e rastrear ainda se existe trombose ou estenose. 

Acesso venoso central

Dentre todos os tipos de acesso vascular, o acesso venoso central é o que o uso do ultrassom como guia é o mais utilizado e difundido na prática. Utiliza-se na grande maioria das vezes, ajudando a reduzir o risco de complicações e o insucesso da técnica. 

Seu uso se dá principalmente no acesso das veias jugulares e subclávias. Com o transdutor no local, é possível observar a veia e a artéria. Ambas aparecem com forma circular e cor escura na imagem,   porém  a  veia  é  mais  compressível  quando  se aplica pressão sobre a pele com o transdutor. A agulha é ecogênica e é vista dentro da veia pelo ultrassom.

Ultrassonografia Point Of Care em Emergência e UTI

Na prática médica, o uso do ultrassom tem se mostrado cada vez mais útil, especialmente em ambientes que exigem decisões rápidas e precisão absoluta. Pensando nisso, o Cetrus criou o curso intensivo em Ultrassonografia point of care em emergência e UTI. Saiba mais sobre o curso e aproveite essa oportunidade. 

Referências 

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  4. SABADO, J.J; MOUSA, A. Basic principles of ultrasound-guided venous access. Uptodate, 2024. 
  5. FRANK, R.L. Peripheral venous access in adults.  Uptodate, 2024. 
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