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Primeiro embrião humano sintético: quais os impactos disso para medicina?

Entenda como o primeiro embrião humano sintético foi criado e quais mudanças e discussões surgem a partir desse avanço científico médico. Boa leitura!

No dia 15 de junho foi publicado um pré-print na bioRxiv, Transgene-Free Ex Utero Derivation of A Human Post-Implantation Embryo Model Solely from Genetically Unmodified Naïve PSCsestudo que anuncia a criação do primeiro embrião humano sintético, feito a partir de células-tronco. Embora divulgado, o estudo ainda não passou pela revisão de outros especialistas.

Em declaração à CNN, Zernicka-Goetz, chefe do estudo e professora de Biologia e Engenharia Biológica da CalTech e da Universidade de Cambridge, explica: “Só quero enfatizar que não são embriões humanos”. E complementa. “Eles são modelos de embriões, mas são muito interessantes porque se parecem muito com embriões humanos e são um caminho muito importante para descobrir por que tantas gestações falham, já que a maioria falha na época do desenvolvimento, quando construímos essas estruturas parecidas a embriões”.

Em contrapartida, Mayana Zatz, diretora do Centro de Estudos sobre o Genoma Humano e Células-Tronco (CEGH-CEL) da USP, em entrevista ao jornal da USP, alerta: “Não podemos afirmar que esses embriões foram criados sem óvulo ou espermatozoide”. E ressalta. “Tanto as células-tronco embrionárias, obtidas de fertilização in vitro, ou as células-tronco pluripotentes reprogramadas são originadas de células obtidas, inicialmente, pela união de um óvulo e um espermatozoide”.

Apesar da pesquisa oferecer um cenário positivo para a compreensão de doenças genéticas e causas de abortos espontâneos, ela levanta debates sobre questões legais e éticas.

Características do embrião humano sintético

Os embriões humanos sintéticos não possuem todas as características de um embrião natural, embora sejam similares ao seu estágio inicial de desenvolvimento. Possuindo células que, em uma gestação comum, ocasionariam a formação da placenta, do saco vitelino e embrião.

São originados a partir de células-tronco pluripotentes humanas, como as células-tronco embrionárias ou células-tronco pluripotentes induzidas (iPSCs), esses embriões são fruto da capacidade dessas células de se diferenciarem em diversas linhagens celulares.

Embora sejam semelhantes, não há resultados conclusivos de que se esses embriões sintéticos fossem implantados em um útero humano, eles conseguiriam continuar se desenvolvendo. Lembrando, que tal teste não é possível de ser realizado, pois é ilegal.

Os embriões humanos sintéticos representam uma conquista notável na pesquisa científica, pois são capazes de imitar estágios iniciais do desenvolvimento do embrião humano. 

O ponto notável desses embriões reside na capacidade de auto-organização das células-tronco. Elas se coordenam e se agrupam naturalmente para formar estruturas que se assemelham aos estágios iniciais do desenvolvimento embrionário, incluindo a formação de compartimentos embrionários e extraembrionários.

Essas estruturas sintéticas conseguem replicar marcos específicos do desenvolvimento, mimetizando características fundamentais do crescimento do embrião humano. No entanto, como comentaremos adiante, surgem questões éticas e legais relacionadas ao tempo de cultivo desses embriões. Enquanto diretrizes existentes limitam o cultivo de embriões naturais até 14 dias, a ausência de regulamentação para embriões sintéticos levanta preocupações sobre a possibilidade de terem sido cultivados além desse limite estabelecido.

Assim, embora representem um avanço científico significativo, os embriões humanos sintéticos também levantam debates éticos e legais cruciais sobre seu desenvolvimento, manipulação e limites temporais, exigindo um amplo diálogo entre a comunidade científica, legisladores e a sociedade para estabelecer diretrizes éticas claras para seu estudo e utilização.

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Desenvolvimento de embriões sintéticos a partir de células-tronco induzidas 

No estudo, os cientistas conseguiram criar estruturas parecidas com embriões humanos em laboratório usando células-tronco especiais. 

Essas estruturas, chamadas de SEMs (Entidades Semelhantes a Embriões Sintéticos), foram criadas a partir de células-tronco pluripotentes, que são células muito versáteis e podem se transformar em diferentes tipos de células no corpo.

O interessante é que essas SEMs se organizaram sozinhas para formar diferentes partes de um embrião humano em desenvolvimento, incluindo partes do próprio embrião e tecidos ao redor dele. 

Como comentamos, elas se parecem com embriões reais, com a mesma estrutura 3D e marcos importantes de desenvolvimento que acontecem naturalmente nos embriões humanos durante as primeiras semanas após a fertilização.

Os cientistas não precisaram fazer alterações genéticas ou usar fatores externos para induzir a formação dessas estruturas. Eles estão trabalhando para entender melhor como essas SEMs se organizam e se desenvolvem, o que pode ajudar em pesquisas futuras sobre desenvolvimento humano e possíveis aplicações médicas. 

A ideia é criar modelos de embriões em laboratório que possam ser úteis para estudos e pesquisas, mesmo que não sejam idênticos aos embriões humanos reais.

 a organogênese, como ocorreu com as SEMs de camundongo, pode fornecer insights valiosos sobre estágios do desenvolvimento humano inicial previamente inacessíveis.

Automontagem de SEM Pós-Implantação humano exclusivamente a partir de PSCs virgens não transgênicas.

Questões éticas e legais levantadas pelo estudo

O estudo de embriões humanos sintéticos levanta uma série de questões éticas e legais cruciais. Em muitos países, a ausência de legislação específica para regular esse tipo de procedimento cria um vácuo legal

As diretrizes existentes para a fertilização de embriões naturais limitam o cultivo até 14 dias, mas a falta de normas para embriões sintéticos suscita preocupações sobre a possível extensão desse período, ultrapassando esse limite estabelecido.

O cultivo prolongado dessas estruturas artificiais até estágios mais avançados, como a granulação, levanta dilemas éticos complexos. Questões sobre o status moral e legal desses embriões sintéticos emergem, já que não existe uma definição clara sobre como devem ser tratados e regulamentados.

A ausência de regulamentação adequada para embriões sintéticos pode gerar debates sobre os direitos, cuidados e responsabilidades associados a essas estruturas. A falta de limites claros pode resultar em desafios éticos ainda maiores à medida que avançamos na pesquisa e no desenvolvimento de modelos embrionários sintéticos.

É fundamental que haja um debate amplo e inclusivo entre a comunidade científica, legisladores, éticos e o público em geral para estabelecer diretrizes claras e éticas para o uso e cultivo de embriões humanos sintéticos, considerando tanto o potencial científico quanto os princípios éticos fundamentais.

Diferenças culturais e criação de embriões sintéticos

As diferentes visões culturais e éticas sobre a criação de embriões sintéticos refletem uma vasta gama de valores, crenças e preocupações em todo o mundo.

Culturalmente, no contexto ocidental, há um foco na autonomia individual e na liberdade de pesquisa científica, priorizando os avanços médicos. Isso geralmente resulta em maior aceitação da pesquisa com embriões sintéticos, privilegiando os benefícios científicos e médicos.

Quanto às abordagens religiosas, diferentes tradições têm perspectivas distintas. Algumas consideram a vida humana desde a concepção, levantando objeções morais à criação e manipulação de embriões, mesmo que sejam sintéticos. Outras visões religiosas podem ser mais flexíveis, tratando os embriões sintéticos de maneira diferente dos naturais.

Em contextos culturais asiáticos, como China e Japão, há uma ênfase no progresso científico e no potencial médico. No entanto, são empenhados pelas considerações éticas ligadas ao respeito pela vida e à harmonia com a natureza.

No âmbito ético, há debates sobre o status moral dos embriões sintéticos e a definição de um limite ético para o tempo de cultivo. Além disso, pondera-se entre os benefícios potenciais para avanços médicos e os riscos éticos associados à sua criação e manipulação.

A participação pública na formulação de políticas éticas para a pesquisa com embriões sintéticos é essencial para refletir os valores e preocupações da sociedade. O diálogo inclusivo entre comunidades, pesquisadores, legisladores e líderes religiosos é crucial para encontrar um equilíbrio ético entre o potencial científico e as preocupações éticas e culturais envolvidas.

Confira: Megabexiga fetal: principais achados ultrassonográficos e condução dos casos

Benefícios futuros para a medicina e pesquisa médica 

Esse grande avanço recente na ciência médica abre portas para entendermos melhor como o embrião humano se desenvolve nas primeiras fases após a implantação. A partir disso, como podemos potencialmente replicar esses processos em laboratório para pesquisas futuras.

Essa compreensão promove as bases da embriogênese humana normal, bem como as anomalias congênitas, já que cerca de um terço das gestações humanas falham entre a implantação e a quarta semana de gestação

Assim, esse avanço recente na ciência não só oferece novas oportunidades para estudar o desenvolvimento embrionário humano, mas também nos leva a repensar a forma como compreendemos e lidamos com doenças genéticas e outras condições médicas relacionadas ao desenvolvimento inicial do embrião. É um passo significativo que pode nos ajudar a avançar na medicina regenerativa e no tratamento de condições complexas desde o estágio embrionário.

Além disso, a criação e otimização dos protocolos para a diferenciação de ESC (células-tronco embrionárias) e iPSC (células-tronco pluripotentes induzidas) humanas em tipos celulares maduros se beneficiaria grandemente ao entender as vias mecânicas, de transcrição e de sinalização ativas durante a embriogênese inicial. 

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Referências

  1. Transgene-Free Ex Utero Derivation of A Human Post-Implantation Embryo Model Solely from Genetically Unmodified Naïve PSCs. Bernardo Oldak, Emilie Wildschutz, Vladyslav Bondarenko, Alejandro Aguilera-Castrejon, Cheng Zhao, Shadi Tarazi, Mehmet-Yunus Comar, Shahd Ashouokhi, Dmitry Lokshtanov. Hanna. bioRxiv 2023.06.14.544922
  2. Jornal da USP. Pesquisadores criam o primeiro embrião sintético sem óvulo e espermatozoide. Disponível em: https://jornal.usp.br/radio-usp/pesquisadores-criam-o-primeiro-embriao-sintetico-sem-ovulo-ou-espermatozoide/. Acessado em: 06/07/2023
  3. CNN Brasil. Cientistas criam os primeiros modelos sintéticos de embriões humanos. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/tecnologia/cientistas-criam-os-primeiros-modelos-sinteticos-de-embrioes-humanos/. Acessado em: 06/07/2023
  4. VivaBem UOL. Cientistas criam embrião sintético usando células-tronco. Disponível em: https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/deutsche-welle/2023/06/15/cientistas-criam-embriao-sintetico-usando-celulas-tronco.htm?. Acessado em: 06/07/2023